O preço de deixar um cadáver político como ministro

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 14/12/2020)

Daniel Oliveira

Só quem não conhece Marcelo pode acreditar que, ao decidir receber o diretor da PSP para ouvir a sua proposta para o SEF, em vez de falar com o ministro, não teve um objetivo político. Só quem anda distraído ainda não percebeu que Magina da Silva julga que não tem de responder à tutela política. Mas isto tem um responsável: o primeiro-ministro. Depois da conferência de imprensa, Eduardo Cabrita é um cadáver político. Como a política tem horror ao vazio, o poder que Costa deixou vago será ocupado por outros. Quem o ocupar tem mais uma tarefa: afastar um diretor que julga ser ministro.


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Só quem não conhece Marcelo Rebelo de Sousa pode acreditar que, ao decidir receber o diretor nacional da PSP para ouvir a sua proposta para o SEF – que passa por abarbatar o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras –, em vez de falar com o ministro, não teve como único objetivo político tornar pública a sua discordância com a manutenção de Eduardo Cabrita no lugar. Guardo para outro texto a falta de autoridade de Marcelo neste tema. Mas tem autoridade para dizer ao primeiro-ministro ou até ao país o que todos sabemos: que a permanência de Cabrita é insustentável. Não pode é subverter a hierarquia da política sobre as forças de segurança. Esteve péssimo, Marcelo.

Só quem anda distraído ainda não percebeu que Magina da Silva julga que não tem de responder à tutela política. Sob a sua alçada, cresce um movimento clandestino de polícias, que tem um discurso abertamente contrário ao Estado de Direito, sem que se conheça um único gesto para impor a disciplina na PSP. Este abandalhamento institucional no conjunto das forças de segurança, de que a existência do Movimento Zero é só mais um sinal preocupante, também ajuda a explicar o que aconteceu no SEF. A autoridade que Magina não exerce dentro da corporação tenta exercer para fora, pondo, por sua autorrecriação, processos a jornais satíricos, numa tentativa de intimidar qualquer crítica para satisfazer os sectores mais radicais que não consegue controlar.

Tudo isto acontece porque não há ministro que alguém respeite. A ida de Magina da Silva a Belém, tendo o topete de se substituir ao ministro no diálogo com a primeira figura de Estado sobre uma polícia que não está sob a sua alçada, é a demonstração do vazio que o poder político deixou numa pasta tão sensível. Suspeito, aliás, que esse vazio não é de agora. Magina da Silva é militar e tem o dever de perceber a gravidade de saltar a hierarquia. Num país onde a obediência dos funcionários do Estado armados ao poder político fosse percecionada como indiscutível, o senhor não passaria nem mais um minuto no comando da Polícia de Segurança Pública.

Mas tudo isto tem um primeiro responsável: o primeiro-ministro. António Costa julgou, em mais um sinal na crença infinita que tem na sua autossuficiência, que bastava manter confiança no seu amigo para que tudo voltasse ao normal. Não volta. Depois da conferência de imprensa que deu, o ministro da Administração Interna é um cadáver político. E pode Costa reafirmar trezentas vezes a sua confiança política nele que não o ressuscita. Marcelo Rebelo de Sousa sabe-o. Magina da Silva sabe-o. O país sabe-o. Como a política tem horror ao vazio, o poder que Costa deixou vago será ocupado por outros. E isso é perigoso para todos nós. Cabrita tem de sair. E quem o substituir, herdou no domingo mais uma tarefa: afastar um diretor da PSP que julga ser ministro.


13 pensamentos sobre “O preço de deixar um cadáver político como ministro

    • Nota. Não sei se o Daniel Oliveira cumpriu o Serviço Militar Obrigatório, sendo que por impossibilidade esteve o adiamento por motivos escolares…, mas não é para mim claro que um eventual desrespeito à tutela política, hierárquica, quando se cumprem funções de chefia num organismo policial civil, civil desde sempre sublinho, seja de tanta gravidade assim (ainda por cima num xadrez em se sabe que a audiência foi solicitada pelo PR, vulgo o chefe-supremo das forças armadas, segundo informa oportunamente o Expresso online). No essencial sobre o tem-te não caias do Eduardo Cabrita e sobre as responsabilidades políticas do abananado António Costa, concordo, mas acrescento que, no tipo, é um padrão tropical, perdão, asiático, perdão, europeu…

      • cumpriu.
        é grave, sim. um dos garantes da democracia é precisamente a subordinação do poder militar ao poder político, daí a existência de (e a necessidade de serem respeitadas) hierarquias. o director terá de ser demitido

        • Nota. Se pedires eu empresto-te as lunetas da irmã Lúcia, comprei-as no OLX, para veres o que escrevi: que o Magina da Silva é director-geral da PSP, que esta é a herdeira da Polícia Civil, ou Cívica, dos tempos da monarquia e da República, que o PR é o comandante-supremo, que foi o próprio quem chamou o chefe da bófia. Neste cocktail, ginástica!, haveria uma real gravidade se o ministro não tivesse sido informado, se fosse apanhado de surpresa e, quase de certeza, que o foi. Ou seja: nem o Magina da Silva tinha de requerer autorização, nem o ministro oportunamente informado poderia legalmente impedir essa audiência. O poder político está representado pelo PR, neste espectáculo psrs maiores de 18 o Eduardo Cabrita não risca quase nada.

  1. O coro dos que proclamam pela saída do Ministro Eduardo Cabrita do Governo, onde sobressaem o barítonos Marques Mendes e Daniel Oliveira, afina em conjunto pela música da partitura ” Tocata e Fuga” em ré menor do BE e pelo som da “Marcha Nupcial” celebrando o casamento do PSD com o Chega.

  2. Este Oliveira é dos sonsinhos mais nojentos que já vi.

    Agora está a fingir que não sabe que, muito mais que o ministro, o presidente da república é superior hierárquico do chefevda policia e que o Mangina não podia recusar falar com ele uma vez convocado.

    O que o Oliveira está a afirmar seria a mesma estupidez de um soldado recusar responder a um general que o convocasse, alegando que só fala com sargentos.

    Enfim é a campanha do bloco contra a policia.

    Seja o que for que um policia faça o bloco está contra.

    Depois queixam-se do movimento zero que eles próprios provocaram com esta marcação cerrada contra os trabalhadores das forças policiais.

    Não deixa de ter graça ver defensores de estados policiais totalitários, no ocidente serem policio-fóbicos nas democracias.

    Se calhar a policia bolchevique que fuzilou a familia imperial russa, incluindo as crianças, o médico e um criado, é que era dos direitos humanos.

    • Peço desculpa, esqueci-me que a humanitária policia bolchevique fuzilou também a dama de companhia e o cozinheiro do czar. Que eram verdadeiros perigos para o povo.

      É um pormenor simpático que ilustra como são fofinhas as forças da ordem quando dirigidas por ministros leninistas e trotskistas como o bloco gosta.

      A sorte foi a família nâo ter um caniche, senão também o fuzilavam. Para segurança do estado, claro.

      • Agora a sério, tu és uma false flag do Chega nao és ?

        Género chamar fascista a toda a gente para as pessoas verem cono os esquerdistas são imbecis.

  3. Quanto ao ministro, o presidente da republica é o comandante supremo das forças armadas e policiais.

    Pelo que está DIRECTAMENTE interessado nos assuntos das mesmas.

    Logo, embora o serviço geral corra a cargo do governo e do ministro, a qualquer momento pode requerer a presença de qualquer membro das forças armadas ou policiais para esclarecer qualquer duvida.

    Não é feito rotineiramente, mas não é caso para demitir logo um ministro. É normal.

    O essencial, com ou sem ministro, devia ser que de isto tudo resulte uma melhoria da actuação das forças policiais.

    Mas parece que há gente mais interessada em intrigas de palácio para prejudicar o governo.

    Quanto ao Oliveira. Bem, acreditar que um tipo que já defendeu o KGB quer realmente uma policia mais fofinha…

    Está mas é a tentar capitalizar com isto a favor do seu partido.

    Quanto á por enquanto maioria dos portugueses, como eu, queremos é que o governo não caia para o PSD não voltar para lá.

    E que se mantenha uma espécie de geringonça, porque o PS sozinho não é assim tal diferente do PSD.

    Mas se se põem a abanar o barco ainda vamos todos para o car…

    Com a esquerda a querer fazer cair ministros, a embirrar com a policia e ainda a chamar fascista, machista e racista a toda a gente, só vão fazer subir o Ventura.

  4. Pedro

    O ministro Cabrita, vai “caír” por iniciativa própria, mais cedo ou mais tarde, a não ser que queira passar pela vergonha de ser demitido compulsivamente…

    Ninguém que eu me lembre, chama fascista à Polícia, enquanto corporação !

    Mas o que é certo, é que a PSP, continua a figurar no “elenco” do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, por violência tão grave como gratuita !

    E o “movimento zero” “corajosamente” anónimo, sem rosto, nasceu por solidariedade mais uma vez corporativa, contra o julgamento e a condenação de alguns “heróis” da Esquadra de Alfragide, que agrediram bárbaramente, miúdos “por acaso”… negros. E o fantoche ventura logo aproveitou o “lixo” que envergonha toda uma Corporação, para o “juntar” na sua lista a apresentar à tentativa de aprovação pelo Tribunal Constitucional, que a rejeitou por três vezes, só a aprovando depois do fantoche se ter comprometido a “embelezá-la”, para não ter o “rótulo” de partido neo-fascista.

    Mas não me admiro que o “lixo” lá continue…

    Quanto ao hediondo assassinato de um cidadão estrangeiro, com extrema barbaridade, por 3 inspectores do SEF, que a directora tentou manter em segredo, por omissão ou para não pôr em risco o seu cargo, e com a cumplicidade (mais uma vez corporativa) de 9 outros inspectores que estão sob investigação, o ministro Cabrita, mais cedo do que tarde, vai “caír”, a não ser que queira passar pela vergonha de ser demitido compulsivamente.

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