Carta Aberta ao Sr. André Matias de Almeida

(Raquel Soares, in Facebook, 13/08/2019)

André Matias da Almeida – Porta voz da ANTRAM

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Boa noite, caro Sr. André Matias de Almeida permita assim chamá-lo, uma vez que curricularmente somos equiparados, talvez eu até lhe ganhe nuns quantos pontos, mas não é isso que interessa.Estou a escrever-lhe após a sua prestação ontem no CMTv pelas 20h e após um grande período reflexivo desencadeado pela felicidade efusiva da minha filha de 18 meses, que ficou acordada até à meia noite à espera que o pai regressasse da greve dos motoristas de matérias perigosas e de carga geral.

Antes de mais, gostaria de felicitar a sua capacidade comunicativa, tem sem dúvida o dom da palavra. O seu poder argumentativo e toda a sua capacidade oratória são de deixar qualquer um deliciado! E sem dúvida que consegue levar o público que o ouve, tal qual um encantador de serpentes.Não é à toa que desenvolve bastante trabalho na área da comunicação social.

Ora bem, voltando atrás ao ponto que referi anteriormente (gosto muito desta sua técnica de retroceder no discurso para fugir às questões colocadas, falando em algo que causará impacto e que levará o interlocutor a esquecer o que falavam anteriormente) o meu marido, como percebeu, é motorista de matérias perigosas e como deve imaginar, novo CCT, ilegalidades no pagamento de subsídios, represálias, excesso de horas, ímanes no tacógrafo e por aí a fora, são conversas que jantam à mesa connosco (quando claro, o meu marido chega a casa no horário que permita jantar em família) e por isso, não posso ficar indiferente ao que referiu ontem em televisão.

Primeiro vou deixar a minha opinião de que já que não faz as suas intervenções televisivas de um modo politicamente correto, faça-o de um modo ético e moral e não ataque pessoas em tempo de antena, quando estas não se podem “defender” no local. Não fica bem, sabe… Ainda por cima destabilizando os portugueses com a desinformação que fornece para os manipular contra os grevistas.

Depois, para além do bla bla bla que falou, e que muito sinceramente o meu pobre cérebro já filtra e apenas retém o que é realmente importante, referiu que a ANTRAM propôs seguros de saúde e exames médicos quando questionado pelas míseras baixas médicas a que estes trabalhadores são sujeitos em caso de doença (consequência dos descontos para segurança social e IRS incidirem apenas numa pequena parte do seu vencimento e que o sindicato luta nesta greve).

Sr. André deixe que lhe diga, que graças a Deus nosso Senhor e ao Sr. Arnaud, a saúde é um bem comum no país onde vivemos através do Serviço Nacional de Saúde! Está decadente é verdade, mas isto também daria uma carta aberta à Sra. Marta Temido.

Voltando ao ponto que referi anteriormente e pegando num ponto importante que referiu e que eu não posso deixar de falar (esta técnica também é boa! mostra ao interlocutor que o está a ouvir, conquistando-o, mas depois discorda completamente do que este disse e volta a levá-lo na sua ideia), os motoristas não querem descontar sobre uma base de 900€ pela sua saúde, pois o seguro apenas abrangeria incapacidades decorrentes de acidentes de trabalho ou de doença relacionada com o trabalho e até se comprovar que o motorista desenvolveu neoplasia pulmonar por inalação prolongada de gases voláteis de combustíveis…ui ui…

Ou seja, o pobre motorista a padecer de uma neoplasia vem para casa com uns míseros 400€ (se tanto!).O mesmo se aplica ao motorista que foi despedido por justa causa por extinção de posto (diz a entidade patronal que em seguida contratou 7 motoristas), após ter gozado o seu direito à greve, vem para casa com um subsídio de desemprego referente a 65% da referência base dos últimos 12 meses dos 14 meses anteriores ao despedimento, se fizer as contas verá quanto fica para governar a casa.Ou então, o motorista que foi pai e que goza do seu direito à paternidade e no primeiro mês de vida do recém nascido e no sexto mês, tem de sobreviver com 83% dos 630€.Não sei se é pai, se for percebe o impacto que a chegada de um recém nascido causa no orçamento familiar… Uma doença… Um despedimento…

Outro ponto que gostaria de referir é aquele que se relaciona com os serviços mínimos e o (in)cumprimento dos mesmos. “Os motoristas trabalharam das 8 às 14h e não abasteceram os postos que costumam abastecer.”Ora pois, Sr André, estes senhores não começam a trabalhar às 8h. Almoçam das 13h às 14h e saem às 16h. Não têm carreira, nem têm aumentos salariais há 18 anos. Alguns destes senhores começam o seu serviço às 6h, e por isso, às 5h já estão a sair de casa para ir buscar o camião à empresa (sim, não sei se sabe não é em qualquer local que um camião com cisterna de matérias perigosas pode ficar estacionado.

Assim como, em caso de furto de gasóleo, mercadoria ou vandalismo da viatura muitas vezes é imputada a culpa e a despesa ao trabalhador) e cumprir o seu horário de trabalho. E ali vão eles com, literalmente, uma bomba às costas. Descarregar matérias perigosas, sim as matérias perigosas não são só combustíveis! São ácidos, são bases e muitos outros materiais que obedecem a um conjunto de regras, procedimentos e processos que devem ser criteriosamente cumpridos de forma a evitar acidentes graves.

Voltando ao ponto que referi anteriormente (estou a apanhar o jeito!) o horário dos motoristas é um bocado estranho diga-se de passagem! Só podem conduzir X tempo e depois têm de fazer uma pausa de Y, mas se conduzirem W são obrigados a parar Z… Estejam onde estiverem… A 500, 300 ou até mesmo 15km de casa, sob pena de serem multados por excesso de horário. O pobre do meu marido já me tentou explicar tudo isto, mas sou sincera, não consigo de todo entender! Mesmo quando são pressionados pelo patrão a usar o íman para que não fique registado o tempo. Há motoristas que não se deixam comprar pelos 20€ de diária se não cumprirem os 5 fretes. E lá vou eu buscar o meu marido por vezes, para que possa dormir no conforto da sua cama e da sua família.

Posto isto, e dado que não me quero alongar, mas terei todo o gosto em o fazer se você assim o desejar, convido-o a trocar esse seu fatinho Slim Fit que deve ter o valor no mínimo do salário base destes profissionais (espero não o estar a ofender), a passar um dia com esta gentalha que come, vive, dorme e trabalha dentro de uma lata, ainda por cima muitos deles só com o 6º ano e que agora lembram-se que querem o maior aumento da história! Onde já se viu?!?

Pois bem… Mas como já percebeu, sem eles e sem TODOS os portugueses a produzir, o país pára e o governo cai. Quem sabe se um novo 25 de Abril não está mais perto que o que se imagina? Sabe uma coisa que valorizo muito na minha profissão Sr. André? É a capacidade empática característica dos enfermeiros, estes desgraçados que às vezes também se lembram de fazer greve, mas infelizmente e por deveres morais e éticos têm mesmo de cumprir os serviços mínimos, porque esses sim, colocam em risco vidas!

Os “seus” serviços mínimos apenas deixam os bolsos dos patrões menos cheios! Assim, sugiro que se coloque na pele destes portugueses que também são prejudicados todos os dias, mas que na sua boca, são os maus da fita!

Atenciosamente.

Enfermeira Mestre Rafaela Soares, Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica na vertente Nefrológica, com competências desenvolvidas na área de Gestão e Liderança nos Serviços de Saúde, formadora certificada, com trabalhos desenvolvidos na área ecográfica do acesso vascular para hemodiálise.(também tenho um bom currículo, não acha? Ah! também domino o Português, Inglês e Espanhol!)

23 pensamentos sobre “Carta Aberta ao Sr. André Matias de Almeida

  1. Pesem embora todas as razões que os motoristas possam ter e, têm, esta greve, conduzida por um aventureiro à beira de se tornar um fora da lei, começa a estar, também , fora da lei e, a ter uma maioria de portugueses contra ela. Esta carta, escrita pela snra enfermeira que, apela não só à queda do governo, como também a um novo 25 de Abril é toda uma vergonha.
    Senhores da Estátua de Sal, não vos peço apenas que tenham pudor mas, também, algum cuidado com as pessoas a quem dão palco. Quase me apetecia acrescentar, também, que tenham vergonha.

    • Porra!

      Nota. Isabel, vergonhoso é o seu comentário! Se o conseguir fazer, no estado de exaltação em que provavelmente se encontra, releia o texto se faz favor. Melhor: se quiser sair daqui direita faça um resumo, parágrafo a parágrafo, e, depois, mesmo que entenda (por vergonha, aposto!) não apresentar publicamente a sua defesa, chegará à simples conclusão de que nada do seu comentário faz sentido. Se quiser compreender o que eu digo, sublinhado, não preciso que mo venha escarrapachar na cara: refere-se ele a uma frase perdida num dos ultimos parágrafos, mas-mas-mas, o meu ponto é que não faz sentido nenhum perder-se a cabeça por causa disso (se é mesmo por causa disso, já agora).

      … e Rafaela, parabéns!

        • Da série “Fun Family Things To Do In #Lisbon, #Strasbourg, #Brussels, Beja, Barcelos, Castelo Branco, Arroios, Penha de França And S. Domingos de Benfica” (especial André Matias de Almeida, da #Antram)

          Ligações ao PS – Parte 1. Deputado municipal na “defesa da terra” e ataque a Governo Passos

          André Matias de Almeida foi eleito deputado municipal pelo PS em São Pedro do Sul no mandato 2013-2017. Antes de ser eleito, aos 24 anos, o socialista tinha sido coordenador da JS local quando tinha apenas 22 anos. Nas atas das reuniões da Assembleia Municipal é possível verificar que André Matias Almeida era interventivo e chegou a criticar o Governo de Passos Coelho.

          […]

          Ligações ao PS – Parte 2. Nomeado duas vezes em 17 dias pelo “amigo” que tinha o irmão no gabinete

          O mandato de André Matias de Almeida na Assembleia Municipal terminou em setembro de 2017. Era deputado municipal quando, a 26 de maio de 2017, foi nomeado presidente do Conselho Geral do Fundo Autónomo de Apoio à Concentração e Consolidação de Empresas (FACCE) pelo Governo de António Costa. O FACCE é um “fundo autónomo de apoio à concentração e consolidação de empresas” criado pelo governo de José Sócrates em 2009, com uma dotação orçamental de 175 milhões de euros, que consiste num mecanismo de cofinanciamento de operações de reestruturação, concentração e consolidação de empresas, em especial Pequenas e Médias Empresas”.

          A nomeação foi feita pelo então secretário de Estado da Indústria, João Vasconcelos, que morreu em março deste ano. André Matias de Almeida diz ao Observador que aceitou o cargo por “convite de um amigo [João Vasconcelos]” e não pela ligação ao PS. Há, no entanto, uma ligação familiar com o então gabinete do secretário de Estado da Indústria. O irmão, Bruno Matias de Almeida (também membro da JS), era técnico especialista no gabinete de João Vasconcelos desde 30 de novembro de 2016. André foi assim nomeado pelo governante com quem o irmão Bruno trabalhava diretamente.

          […]

          Nota. Muito bom, é novinho mas já tem um excelente cadastro! Afinal, quem é que é o pardal (quem é)?

          #pardalitos
          #pardalões

      • E tu, RFC, és um troll que polui caixas de comentários com frustrações e um desejo ridículo de auto-afirmação. Quando à Estátua de Sal dar palco uma ressabiada como esta, digamos que tenho pena, mas já não me surpreende.

      • Adenda (recordar é viver). Ah, e sai também uma ligação em directo à sala do arquivo d’A Estátua de Sal… Antes dos lindinhos acordarem para a vida, tinha-lhes tirado eu a pose na minha tabanca de photographo ambulante (embora reconheça que o PS não estava na altura completamente enrolado, como agora, entende-se da sua releitura que permanece lá o essencial da questão, que antes de tudo é política!). É ler ou reler, sugiro.

        RFC diz:
        Agosto 8, 2019 às 1:54 pm

        Adenda (sobre os protagonistas).

        Pedro Pardal Henriques, para além dos cadáveres que tem no armário e também por isso mesmo, pergunto-me sobre quem poderia desempenhar este papel em favor da classe dos motoristas de substâncias perigosas? É diferente da Ana Rita Cavaco, ou do Mariano dos estivadores, é mesmo? Descendente de camionista, licenciado tardiamente e advogado, pequeno (ou médio?) burlão, self made man, gel, óculos de design, eventual cordão de ouro e cachuchos a luzir no indicador e no anelar, o Maserati para os raides às manifs da classe, assim parece-me ser uma figura tipicamente portuguesa. Não será nestes tempos mais breves, só num estado policial isso poderia acontecer (!), mas não estranharia o facto de ser apanhado pela bófia. Isto ou, diz-se hoje, que poderá enveredar por uma aventura política ao estilo de Matinho e Pinto, o que reforçaria o perfil que esbocei no princípio. Seja como for, quer-me parecer que deixará para contar aos seus desendentes o facto de ter conseguido deixar um país moderno, vá lá!, de pernas para o ar no ano impensável de 2019. Isto e ter deixado uma classe política caquética com a cabeça a andar à roda, é ver ontem a performance do Viieira da Silva e a do Matos Fernandes com aquela voz de bêbado (há ali um padrão de fascistazinho que se exponenciou aquando do prédio Coutinho, acho).

        versus

        André Matias de Almeida, advogado, militante do PS, parece ser um equivalente dos antigos boys socialistas… mas aditivado. À volta da mesa do Conselho de Ministros, nos cargos de secretários de Estado, nos serviços desconcentrados do Estado em cargos sob nomeação política e, principalmente, nos gabinetes ministeriais há dezenas de tipos socialistas vindos da JS com este… curriculum (cadastro, na verdade). E o seu ar modernaço casa bem com o seu discurso de jovem lobbyista, ou porta-voz, ao serviço da Antram ou de outro qualquer sector empresarial clássico, rendoso e decadente (poderia estar ao serviço da indústria extractiva, da pesca industrial, da indústria da pasta de papel, de uma CAP da agricultura intensiva, por exemplo). Dito isto, na verdade fala de igual para igual com as gerações mais novas do PS, do CDS ou do PSD, clean, que frequentam o ginásio e se encontram nos lugares informais do poder, só para homens!, cujos valores não vão para além do pragmatismo do dia de hoje, a quem ser culturalmente de esquerda lhes diz nada, sem formalmente o fazer, fazem parte da geração que faz carburar o governo… E é isto e um certo discurso autoritário [que] mete medo, admito.

        https://mb.web.sapo.io/7ba10de31dd67913fc51322c9b6e89ca88abff62.png

  2. Cara enfermeira e, por isso mesmo, com a sua defesa desta greve e com o ventinho partidário que nos traz e o odor do tipo de greve do passado da sua profissão e manipulada pela ordem não vale a pena dizer mais nada. Está tudo dito. Só acrescento que ao falar em quedas do governo estamos a ver não estamos a consonância….

    • Destes 10 comentarios sobre a carta aberta da estatua de sal 7 (sete) são do RFC! Quase 100% das linhas escritas tambem são do RFC! Uma catadupa de insultos que a estatua patrocina. Depois disto a estatua diz candidamente “sou um democrata” . Sem mais comentarios!

  3. Sra. Enfermeira, o seu marido é obrigado a ser camionista?
    Com o seu currículo escolar porque não o incentiva a retomar os estudos e arranjar um emprego melhor?
    E se tem alguma paixão,esquisita, por camiões-cisterna porque não compra um e se paga a si próprio?

    • E quem paga a formação é o ordenado que se perde?
      E, se fosse possível, em que é que isso justifica condições laborais deprimentes? Ainda por cima num trabalho sem o qual nada funciona.

  4. Nota. Olha para mim a copiar a parte mais interessante de um artigo da Raquel Varela (uma moça da Acampada do Rossio), ó da Estátua de Sal! Eu não tinha dito que, do trio-maravilha Raquel-Renato-Viktor, só o camarada Viktor é que ainda não tinha visto a luz? 🙂 É o PS/Galp-pois-é, pás.

    […]

    Esta requisição civil soma-se à
    tentativa — malograda depois em
    tribunal — de impor serviços
    mínimos na educação; aos
    “fura-greves” de Setúbal
    patrocinados pelo Governo; à
    sindicância à Ordem dos
    Enfermeiros e requisição civil. Estas
    medidas avizinham o pior, um
    Governo com um forte pendor
    autoritário face ao mundo laboral,
    que abre as portas a medida mais
    duras da direita, que tem agora o
    Estado-força legitimado por uma
    “geringonça” de esquerda no
    poder, e sempre apoiado pelo
    Presidente da República. Isto é
    tanto mais grave quanto vivemos
    tempos autoritários em muitos
    países.

    O mais crítico deste conflito é que
    o direito à greve foi totalmente
    posto em causa com serviços
    máximos e militarização dos
    protestos sociais. Perante a própria
    contestação dentro das Forças
    Armadas, Costa respondeu que… só
    fala com comandantes. Sim, o
    perigo da extrema-direita não vem,
    ao contrário do que aqui escreveu
    Boaventura Sousa Santos, de um
    sindicato democrático de base não
    alinhado à CGTP ou à UGT a lutar
    por 900 euros. Vem do desenho
    autoritário que o Governo está a
    querer impor.

    A leitura de um parecer da PGR
    pelo ministro em directo,
    confessadamente feito em tempo-
    -recorde e usado para impedir o
    exercício da greve, sem ter tido
    contraditório, é um traço da
    bonapartização do regime. Com
    base neste parecer, desconhecido
    de nós, o ministro explicou que
    greve é quando o Governo quiser,
    como quiser. Greve é permitida se
    não puser em causa a produção…
    Como?! As greves são feitas para
    parar a produção! Essa é a razão de
    ser de uma greve. Os serviços
    mínimos só podem ser aplicados a
    emergências, e aí devem ser
    escrupulosamente respeitados. Mas
    nada além disso.

    Há duas décadas, estes
    trabalhadores trabalhavam numa
    empresa pública chamada Galp,
    oito horas por dia e ganhavam o
    equivalente hoje a 1400 euros, dois
    salários mínimos e meio. Agora
    trabalham para PME que são
    subcontratadas das petrolíferas,
    que fixam um preço por quilómetro
    abaixo do custo real (alegadamente
    cartelizado). A Galp anunciou para
    este ano 109 milhões de euros de
    lucro.

    O silêncio das associações
    petrolíferas é explicado pela
    “empresa enxuta”. A casa-mãe tem
    no topo da pirâmide 5% de
    trabalhadores mediamente pagos, e
    as subcontratadas recorrem ao
    trabalho à jorna, à peça, e mal pago.
    Na EDP, os custos com Segurança
    Social são 4%, nas subcontratadas
    são perto de 30%. Como será na
    Galp e na Antram? Estas PME,
    normalmente nascidas a partir do
    desmembramento de uma grande
    empresa, às vezes até fazem
    outsourcing em que os próprios
    trabalhadores são “empresários”.
    Mas são as grandes empresas que
    fixam todos os preços de produção.
    A Galp e outros gigantes da energia
    elevam os custos de toda a
    economia, prejudicando um país
    inteiro.

    O Estado considera tabu
    nacionalizar a Galp, mas normal
    contribuir para este caos
    empresarial flexibilizando a lei
    laboral. Mas faz mais — substitui as
    políticas de pleno emprego pelas
    políticas de desemprego. E é aqui
    que os sindicatos em geral e os
    partidos de esquerda são
    complacentes. Porque ninguém
    vive com 600 nem com 700 euros.
    Ao baixo salário junta-se a
    electricidade subsidiada, a renda
    social, o subsídio social de
    desemprego, a cantina gratuita para
    os filhos, a isenção de taxas
    moderadoras, enfim, uma panóplia
    assistencial focalizada (e não
    universal), onde os sectores médios
    pagam cada vez mais impostos, e as
    grandes empresas cada vez menos.

    Em vez de um Estado social
    universal (para todos) baseado em
    impostos progressivos, temos um
    Estado assistencial focalizado (para
    trabalhadores pobres) sustentado
    por impostos regressivos. Ou seja,
    os sectores médios financiam as
    empresas pagando a assistência dos
    trabalhadores mal pagos. Para além
    da injustiça fiscal, as consequências
    mais graves do assistencialismo são
    outras, são políticas: a infantilização
    da população dependente desta
    assistência que não conhece os seus
    direitos, mas vive de mão estendida
    ao Estado, de forma passiva,
    submissa, a provar a sua “pobreza”.
    A extrema-direita cavalga estes
    sentimentos.

    Os motoristas começaram a sua
    greve com o grito dos estivadores de
    Setúbal, “nem um passo atrás!”,
    estivadores que ao fim de 39 dias de
    greve total conseguiram um salário-
    -base de 978,47€ mais subsídio de
    turno de 175,32€, isto é, 1153,79€.
    Tudo na folha de recibo com todos
    os descontos legais inerentes.

    Os motoristas estão a defender a
    democracia porque estão a
    defender o emprego com direitos.
    Estão a defender a democracia
    porque estão a defender o direito à
    greve. É uma tarefa colossal para
    um punhado de homens, mesmo
    que determinados. A sociedade
    portuguesa, e à cabeça todos os
    sindicatos democráticos, não os
    devem deixar sós. Não estamos a
    debater o carro de um advogado,
    mas os destinos de um país.

    Fonte: P., 15.8.2019, pp. 6-7.

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