(Por José Sócrates, in Expresso, 16/03/2019)
(Afinal, Sócrates estará a falar, e bem, de quem? A Estátua não é rica, mas mesmo que o fosse ficaria na penúria se tivesse que dar alvíssaras a quem acertar no alvo visado, uma espécie de versão 2 da “mão atrás do arbusto”…
Comentário da Estátua, 16/03/2019)
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Na teoria da arte, o conceito kitsch atira em várias direções. Uma delas, talvez a principal, tem o significado de arte de má qualidade, arte de mau gosto. Uma outra dimensão, próxima desta, tem a ver com a ideia de arte “falsa”, aquela que copia e pirateia o que já antes foi produzido, pretendendo apresentar-se como nova. Uma outra, ainda, designa a arte “fácil”, a arte de estilo superficial que nenhum esforço interpretativo exige do espectador. No entanto, o aspeto mais importante e talvez mais moderno do conceito está ligado à ideia de antecipação do resultado artístico — um certo tipo de arte que recorre a estereótipos e clichés já testados anteriormente por forma a garantir agrado e audiência. No fundo, uma arte de prazer fácil e sem riscos: “arte previsível, com efeitos previsíveis, com recompensas previsíveis”.
Previsibilidade. Eis o terreno onde o estilo artístico se encontra com a política. O equivalente kitsch na política resulta, no essencial, da ideia de que é possível apurar antecipadamente o gosto do auditório para permitir, então, formular os juízos que se sabe de antemão serem do agrado de quem os escuta. A operação prévia de “contar narizes” determina, assim, a palavra e a ação do protagonista político que julga, desta forma, poder escapar à imprevisibilidade da reação do público. Dito de forma radical, o kitsch político aspira a despojar a política daquilo que mais intrinsecamente a caracteriza — o risco e a contingência da ação.
A incessante busca de certeza e de garantia de sucesso há muito que ameaça converter a atividade política numa verdadeira indústria de assessores, de consultores, de especialistas que afiançam poder transformá-la num jogo seguro e garantido: eles analisam, eles sondam, eles estudam, eles diferenciam o “mercado eleitoral” e catalogam os seus humores.
Diferentes áreas do saber sociológico (e mais recentemente do poder tecnológico) juntam-se para eliminar a complexidade social e criar em laboratório os guias e os planos de ação capazes de oferecer resultados garantidos. Joguemos pelo seguro: dizer só o que é “aceitável-porque-já-aceite”. Em breve estarão todos a dizer o mesmo — o vulgar, o consensual, o idêntico, o insuportavelmente idêntico. Neste cenário talvez nada seja mais seguro que a cartada da afeição, afinal o recurso óbvio de quem não sabe viver sem a atenção do público.
A ilusão de uma atividade política previsível e sem risco (sempre vinda de quem garante conhecer e dominar o jogo) tem como consequência diminuir o vocabulário, eliminar a diversidade e empobrecer de tal forma o espetáculo público da política que o torna progressivamente maçador, redondo, previsível. No limite, já pouco de intrinsecamente humano o habita: dali não virá nem novidade, nem surpresa, nem espanto — nada que não seja previamente testado e previamente aceite. Política técnica: fiquemo-nos pela pesquisa de opinião e pelo focus group, evitando riscos inúteis.
Qualquer coisa nova ou diferente será sempre uma incógnita e uma ameaça às sondagens e às audiências — afinal, a única coisa que conta. E, no entanto, contra todas as evidências e contra todos os cálculos, é sempre essa coisa nova e singular que esperamos, qualquer coisa que nos faça levantar os olhos e reconhecer de novo a política na sua dimensão do imprevisto e da coragem. Qualquer coisa que valha a pena.
Caro “estatuadesal” esta é incompletamente uma nova versão da “mão atrás do arbusto” já conhecida pois esta nova mão, pé, boca e corpo é visível diariamente por todo lado sempre ao lado e bem na frente dos portugueses através dos media.
Pode dizer-se que é sim, no sentido dos objectivos políticos, uma nova modalidade de “meter a mão atrás, à frente, por cima e aos lados” mas desta feita segundo formula velha de populismo de sempre mas agora aparentemente tentada sob forma tecno-modernaça com base num aparato kitsch intencional para levar a água ao seu moinho.
Sócrates como sempre, ele mesmo e genuíno, contra todos os calculismos e calculistas moralões bem pensantes e instalados que a quem tem a coragem do risco no novo e no imprevisto acusam de “pôr-se a jeito”.
Concordo caro NEVES!
Tudo certo, mas o que fez ele durante 7 anos? Governar pela política previsível de especialistas económicos que nos levaram a hoje, trazendo-nos ministros miseráveis que ainda continuam o legado.
Nota. Nem mais, Manuel G., eis o nível do Zé e como anda pelas ruas da amargura..
fcancio
@fcancio
25 de fev
com esta cena toda fiquei com curiosidade em saber quantos filhos tem a tal médica e o q faz e quanto ganha o marido, e como é q ela arranja tempo para fazer as cenas todas da casa s p além da medicina ainda s põe a escrever textos. espero bem q tenha sido o marido a escrever.
Mário Cunha Reis
@MarioCunhaReis
Em resposta a @fcancio
Satisfaço a sua curiosidade. Tem mais filhos que o Zé; o marido tem um trabalho honesto, ao contrário do Zé, e, talvez por isso, ganha menos que o Zé. É notável, de facto. A médica consegue fazer tudo isso, incluindo escrever os seus próprios textos, ao contrário do Zé.
14:00 – 26 de fev de 2019
Nota. Isto deste gajo do CDS é brilhante, não achas ó Manuel G.? Por mim, do Zé, chega-me.
Finais dos anos 70, na Faculdade de Direito, assisti a uma conferência promovida pela UDP (sim, UDP) em que o convidado era o visado neste brilhante texto.
O tal, o convidado, que já sabia ao que vinha, depois de “ler” a sala, conseguiu ser mais UDP do que os UDP presentes.
É um artista. E será.
🙂
Os textos atribuídos ao Zé não são da sua autoria. A farsa vem de longe e persiste. Como lamento que a nossa vida colectiva seja alimentada por perturbados doentes e farsantes!