A confissão de Sérgio Moro

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 02/11/2018)

Daniel

Daniel Oliveira

O juiz de Curitiba que concentrou nas suas mãos quase todas as fases do processo contra Lula da Silva, foi, sem espanto de ninguém, convidado para ser superministro do Presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro. E, sem grande espanto também, aceitou. O magistrado concentrará as pastas da segurança e da justiça, coisa muito pouco habitual em democracias maduras. Coisa que o Brasil obviamente não é.

A aceitação deste convite levanta uma primeira inquietação que, não sendo a mais relevante, nos leva para um debate que transcende o Brasil. O governo de Jair Bolsonaro quer alargar de tal forma o conceito de legítima defesa que liberalizará, na prática, a justiça pelas próprias mãos. E quer proibir a investigação de agentes policiais que matem em confronto, o que corresponde a uma ordem geral para matar. A sua agenda em matéria de segurança é próxima da do Presidente filipino, ao estilo de Rodrigo Duterte. O facto de um juiz se sentir confortável com esta agenda diz alguma coisa sobre a sua desvinculação aos princípios fundamentais do Estado de Direito, o que explica muito do que aconteceu no processo contra Lula. Não está sozinho. Há cada vez mais juízes a acreditarem que o seu papel é apenas combater o crime, não é aplicar a justiça. O primeiro objetivo não esgota o segundo.

É bom recordar que Sérgio Moro não se limitou a julgar Lula da Silva. Fez disso um espetáculo político, que foi gerindo em proveito próprio e de terceiros. Da divulgação para a imprensa, ilegal mas totalmente assumida, de escutas de conversas entre Dilma e Lula, com o objetivo de dar força às manifestações contra o governo do PT, a escutas aos advogados do ex-Presidente, tudo foi permitido. Quem se deu ao trabalho de acompanhar o julgamento de Lula sabe que o resultado final foi um aborto kafkiano.

Sérgio Moro usou o poder judicial com propósitos políticos que incluíam a construção de uma carreira fora da magistratura. O que faz dele mais corrupto do que todos os homens que julgou. Porque não há corrupção mais profunda do que a moral

Os objetivos políticos de Moro ficaram totalmente evidentes quando agradeceu a manifestantes de direita pelo apoio que lhe davam nas ruas ou quando fez um vídeo, na véspera das eleições, a falar de corrupção. Só um cego não tinha ainda percebido que Moro tinha ambições políticas. Muito mais grave foi a decisão de Sérgio Moro divulgar, há um mês e em plena campanha, a delação premiada de António Palocci, ex-ministro de Dilma afastado por corrupção. É que segundo o vice-presidente Hamilton Mourão, o juiz já tinha sido convidado, nessa altura, para este cargo. A decisão de divulgar a delação na campanha foi, portanto, de um ato político de que Moro sabia que iria beneficiar.

Podemos suspeitar que Moro esperava, com o seu comportamento nos últimos anos, por um prémio político que agora lhe chega através de um superministério que será a rampa de lançamento para vir a ser Presidente, cargo que evidentemente ambiciona. Mas não precisamos de fazer conjeturas. Podemos ficar pelo que é indiscutível. Sérgio Moro não é um juiz que aceita um cargo político. Ele foi uma peça fundamental num processo judicial que, pelos efeitos que teve no sistema político, abriu espaço para o crescimento de uma candidatura com a natureza de Jair Bolsonaro. E foi o elemento central para impedir que o candidato mais forte concorresse às eleições. Isto deveria chegar para o impedir, por um imperativo ético, de ir para o governo do homem que mais beneficiou com o seu trabalho. A aceitação do cargo revela uma total indiferença perante a necessidade de preservar a imagem de independência da justiça face ao poder político.

Sérgio Moro sempre foi um político disfarçado de juiz. Representava um sector da magistratura de traços populistas que premeditadamente procuraram criar um ambiente que, para além de afastar uma pessoa da candidatura à presidência, favorecesse a ascensão ao poder de um político de perfil autoritário e justicialista. E que esperava ter, nesta nova era, um papel relevante. Usou o poder judicial com propósitos políticos que incluíam a construção de uma carreira fora da magistratura. O que faz dele mais corrupto do que os homens que julgou. Porque não há corrupção mais profunda do que a moral.

15 pensamentos sobre “A confissão de Sérgio Moro

  1. Ó cara de bébé chorão, mas qual corrupção moral qual caralho pá.
    Então um gajo que vende o poder que lhe foi atribuído e pago pelo Estado como juíz em proveito próprio para ser ministro é tão só corrupto moral?
    Então um gajo que vende as Leis do seu país para obter um proveito futuro em nome individual é só corrupto moral?
    Então um gajo que utiliza um poder de Estado intocável para seu uso tendo em vista um posterior benefício próprio é apenas corrupto moral?
    Então um gajo que usa o poder e forças do Estado para prender um ex-Presidente de Estado como inimigo político somente por que tem em vista uma carreira política ideológica oposta ao que mandou prender é um simples corrupto moral?
    Então a um gajo que gastou milhões de reais do erário público em proveito próprio é ou diz-se que é um corrupto moral?
    A um gajo que vende um poder outorgado pelo Estado tendo em mira a obtenção de um futuro elevado lucro individual é, em qualquer democracia civilizada, um corrupto, é um corrupto pulha, é um corrupto total porque vende o povo que lhe outorgou o produto vendido em proveito próprio.

    Corrupto moral és tu e fortemente, Oliveira, quando dizes que Sócrates tem de ser julgado e condenado com provas ou sem provas porque caso não o seja estão criadas as condições para a eleição de um Bolsonário português.

    Não são as fake news do “Expresso”, “Sol”, “cm” e outros e as notícias de violações, facadas, roubos e malfeitorias do governo democrático dadas em moto continuo para desvalorizar e desacreditar a Democracia afim de, deliberadamente, criar o ambiente de um estado geral de corrupção e medo, propício ao aparecimento de bolsonáriosoe.
    Ou o desleixo e deixa andar, por parte da Democracia, das violações constantes do segredo de justiça, da bandalheira de TVs a passarem videos dos interrogatórios de juizes, de sindicalistas a ameaçar que cercam e paralisam cidades, de forças policiais que tentam invadir a AR sem a mais pequena reclamação da Democracia pelo respeito da Lei e do Estado de Direito.
    É neste clima mole de “deixa andar” de desrespeito pelo Estado de Direito Democrático em todas as áreas de associações corporativas que originam os desassossegos, intranquilidades e por fim medos que levam as pessoas simples e trabalhadores honestos normais a falar entre si que o que é preciso são “três salazares” para “endireitar isto”.

    • Fazia-te bem leres/ouvires o que o Daniel publica, escusavas de dizer disparates sobre o que ele acha sobre a pouca vergonha dos casos Sócrates.

      • Corrupto moral és tu e fortemente, Oliveira, quando dizes que Sócrates, também preso para ser investigado e acusado sem provas e por “indícios” por um Moro português, tem de ser julgado e condenado com provas ou sem provas porque caso não o seja estão criadas as condições para a eleição de um Bolsonário português.

      • O que ele acha agora! É um envergonhado tardio, antes da vergonha era só um opositor político do coiso. Hoje é, curiosamente apoiante timido do seu número dois, o que, convenhamos, em qualquer país civilizado, onde o número dois do coiso, alguém tão envolvido em tanta lixarada, em tantos negócios ruinosos, no mínimo, para a coisa pública, envolvido com tanta famiglia, com tantos melhores amigos, nunca chegaria ao poder, isto se estivesse sequer em liberdade, seria motivo de profunda vergonha.

    • José Neves, porra!, pede imediatamente desculpa ao senhor Daniel se não te importas.

      Vou agora ligar para o senhor presidente da Junta para ele falar com o comandante dos Bombleiros Voluntários de Monchique e vão-te buscar para descansares uma semanita, ou quinze dias, num lar de idosos aí perto do monte. Não te enerves, é melhor para ti porque nesse estado de ansiedade em que te encontras é um perigo. Não te esqueças de meteres num saco as caixas e os frascos de comprimidos para mostrares às senhoras enfermeiras, ‘stá bem? Prepara também um pijama de flanela que está frio durante a noite, as pantufas, leva uma gillete, o pincel e um bocado de sabão-macaco para fazeres a barba e, não te esqueças se tiveres, uma escova de dentes nova (se não, paramos numa bomba de gasolina ou num supermercado).

      Eu daqui a bocado ligo outra vez, até já.

      • Ah!, e traz também o livro de engenharia mecânica que pode ser necessário para endireitares o beliche, a cómoda ou o guarda-fato… Sim?

      • Tens razão, ó Arthur!

        Daniel Oliveira; desculpe.me, tenho de lhe dizer que exageree e que, hoje ou ontem de madrugada, fui excessivamente rude consigo. No entanto, tal como eu você tem de ter a coragem de admitir que o senhor não é tão bom como o Grande Valupi que, apesar da sua prática sexual passiva quotidiana duranre estes anps todos, nunca teve a desfaçatez nem a falta de vergnha de criticar o Grande José Sócrates

        Deixe-me, por isso, que lhe dedique um dos poemas que eu escrevi:

        Oliveira, o do Olival ó Daniel!,
        Não, não tenho vergonha de o dizer,
        Que nunca será tão bom como o José,
        Mas quando me encontrares, ó pá!,
        Não te acanhes e dá-me em cheio
        No traseiro um… pontapé!

        Pedi que me corrugiçem os erros. Bom e engraçado, não acha?

    • Ó JN, excelente opinião, (foi só pena o carvalho…, esse é que abadalhoca a cunversa…, entre pessoas civilizadas).

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