Embora aí Santana, que já não enganamos ninguém 

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 05/07/2018) 

santanax

 

Mais uma vez, Pedro Santana Lopes veio anunciar que não fará mais política dentro do PSD. Já o anunciou de várias formas, em vários contextos e com diferentes argumentos, sempre com a mesma consequência: continuou a fazer política dentro do PSD, único partido onde as suas rábulas ainda podem ter alguma relevância. Santana Lopes foi presidente da Câmara de Lisboa porque João Soares fez a pior campanha eleitoral de que há memória na democracia portuguesa, foi primeiro-ministro porque Durão Barroso lhe ofereceu o lugar e, poucos meses depois, teve o pior resultado da história do PSD. Sempre que dependeu apenas dele correu mal. Internamente, foi esmagado por Marcelo Rebelo de Sousa em 1996, perdeu para Durão Barroso em 2000, ficou atrás de Manuela Ferreira Leite e Passos Coelho em 2008 e voltou a perder com Rui Rio nas últimas primárias. Quando Santana diz que “o PPD começa a estar farto do PSD” está a falar dele. Ele está farto de um partido que teima em não o querer (já o disse quatro vezes) apesar dele se imaginar sempre desejado.

Santana Lopes dedica-se à política há quase meio século. E, no entanto, nestes quase cinquenta anos não lhe conhecemos uma ideia para além das banalidades que se devem dizer a cada momento. É quase motivo de admiração, devo dizer, que alguém se dedique tantos anos a uma atividade sem nunca verdadeiramente se concentrar no que há de mais essencial nessa atividade.

Nem por um momento Santana Lopes parece ter sido assaltado pela angústia do sentido que tem a sua atividade cívica e profissional. Sejamos justos: Santana nunca fez política para enriquecer, nunca fez política para ter poder, nunca fez política por sentido de missão. Santana faz política como poderia dedicar-se a qualquer outra atividade pública: para existir para os outros. Não precisa de mais do que isso, o que o torna inofensivo. Mas é a única coisa que tem para nos oferecer: a sua existência.

Foi autarca e não tem uma ideia do que deve ser uma cidade. Não tem qualquer pensamento sobre políticas urbanas, de transportes ou de habitação. Tem obras, tem medidas, tem propostas avulsas. Não consegue integrar nenhuma delas num projeto mais geral sobre os grandes problemas que se levantam à vida urbana de hoje. Foi primeiro-ministro e qualquer debate que alguém tenha com ele sobre o papel do Estado na economia, o Estado Social ou a crise da União Europeia, esbarra em frases feitas. Dirão que a maioria dos políticos é assim e talvez seja verdade. Mas não o são os outros políticos que chegaram a primeiros-ministros. Mais sérios, desonestos, populistas, sóbrios, todos se esforçaram por criar o seu perfil político e passar a ideia de que tinham uma ideia para o país. De Santana Lopes, ninguém sabe dizer se é mais liberal ou mais social-democrata, se acredita em mais ou menos Estado. Não porque o esconda. Só nunca pensou nisso. Porque para ele nunca existiu política para além da tática de uma campanha. Não é oportunismo. É mesmo ignorância. Pedro Santana Lopes é o político português que chegou mais longe sabendo menos de política. Estou a falar da política de conta, não de jogos florais ou fogos de artifício.

O enésimo anúncio de que vai abandonar a intervenção política no PSD é a repetição de um número mediático de um homem que já esgotou todos os que tinha. Poderá acreditar que os deserdados do “passismo” o seguirão, não se apercebendo que na última eleição interna do PSD foi liderado e usado, não liderou ninguém. Uma vitória conseguiu: há várias pessoas informadas a fingir que levam a sério um novo partido liderado por Santana. Mas tudo isto acabará de duas maneiras: ou sai sozinho e andará aos caídos a tentar criar factos políticos que duram uma semana, ou fica no PSD, como fez das outras vezes, seguro que da próxima que tente a sua sorte ninguém se lembrará deste episódio. Porque Santana é Santana. Já só provoca um encolher de ombros. Já não engana ninguém.

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