A ALEGORIA EM CÂNCIO OU O CASO IWAZARU NO RESCALDO DA VIDA

(Virgínia da Silva Veiga, 08/05/2018)MACACCO

Então vamos lá, em época de pouca inspiração: se estamos perante uma jornalista que não consegue distinguir a verdade da mentira em fonte próxima, Câncio, confessadamente, estaria a declarar-se publicamente incapaz para a profissão.

Sejamos compreensivos. Foi mau, mas não foi isso. Como revela a superficialidade do seu polémico artigo, que nada tem de jornalístico, é um desabafo clássico, típico dos amores, também da mulher, quando toldada pelo mais velho sentimento do mundo, quando tem esse feitio. Entramos no campo íntimo e delicado das paixões findas e na preciosa opção de se saber manter a difícil consideração mútua de memória dos bons momentos. Prismas sobre dignidade.

As regras do amor são bipolares. Ai de quem assim as não analise. Gente serena em pose de adulto torna-se um passarinho a cantar poemas à lua ou um egocêntrico furioso. Ou uma egocêntrica furiosa, conforme o lado para que se vira a objectiva.

Nada a julgar. É o maldito do amor nos seus contornos.

O que diferencia as pessoas é compreenderem que tudo isso é passageiro, nos ultrapassa, nos “tira do sério” como dizem os brasileiros e, portanto, melhor deixar que o tempo nos deixe voltamos a ser nós próprios. Ninguém se leve nunca a mal de ter vivido tal ridículo, porque o Amor sem ridículo não existe.

E lembrou-me isto tudo a lenda dos três macacos sábios de Togoshu. Um, o surdo, observava o comportamento humano, transmitia-o depois ao cego que finalmente o relatava ao calado para que, no bom senso, o ignorasse em nome do bom relacionamento humano, de seus nomes Mizaru, Kikazaru, Iwazaru. Por ironia, a lenda japonesa vai parar a Sócrates, imagine-se! O da Alegoria da Caverna, entenda-se, igualmente vítima de julgamento injusto. E, nem de propósito, conta-se sobre ele uma história que este nunca viveu, falsa, portanto, a trazer contudo, um interessante ensinamento.

Conta esta outra invenção, conhecida pelos “Três Filtros de Sócrates”, imputada a este outro sem que e a tenha escrito. Conta-se que um aluno se terá abeirado dele para lhe contar um rumor ou, dito em termos de hoje, uma suspeição que alguém levantara sobre uma pessoa.
O Homem do excesso da luz que cega ter-lhe-á pedido que, antes de começar a fazer relatos e emitir opiniões, em primeiro lugar garantisse que o que dizia era verdade.
O aluno não podia garantir.
Perguntou-lhe então se o que ia contar era bom.
O aluno não podia garantir.
Por fim, queria que o aluno tivesse por certo que o relato que ia fazer era tão útil que justificasse abordar um assunto que não conhecia a fundo nem conseguia garantir não ir resultar numa maldade para com o visado.
E o aluno calou-se.
Filosofa de vida, as duas lendas.

Nada como tomar aviso na história contada sobre também este Sócrates, e, não se sendo nem surdo, nem cego, ser-se avisadamente mudo como Iwazaru, o macaco da Sabedoria.

Coisa que, no seu Amor perdido, Câncio – isso viu-se – não tendo, infelizmente, por filosofia pessoal saber esperar – ela e um bom par de políticos – , se espera que ainda aprenda.

A lição vale para homens e mulheres. Vale para um País.

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