Liberdade para os presos políticos catalães

(José Soeiro, in Expresso Diário, 31/03/2018)

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José Soeiro

Depois de, no fim do ano passado, o governo espanhol ter dissolvido o Parlamento eleito da Catalunha e provocado novas eleições, Carles Puidgemont deixou um compromisso e uma pergunta. Antes de se saber qual seria o resultado, o compromisso era que os independentistas respeitariam escrupulosamente o resultado desse ato eleitoral. A pergunta era se o governo espanhol do PP faria o mesmo.

Como se vê, não fez. A resposta do Reino de Espanha não podia aliás ter sido mais expressiva. Os 13 ex-membros do governo da Generalitat da Catalunha, bem como deputados eleitos nas últimas eleições regionais a 21 de dezembro de 2017, estão acusados de crimes como rebelião, sedição e desvio de fundos. Além disso, foi emitido um mandado de captura europeu e internacional para todos os que, entretanto, decidiram exilar-se para evitar a perseguição.

O autoritarismo do governo e a sanha punitiva do Supremo Tribunal não têm tido limites. Mais de um milhar de autarcas e de diretores das escolas foram acusados por terem colaborado na organização do referendo de outubro. A libertação dos presos políticos catalães, que nunca usaram qualquer meio violento para defender os seus pontos de vista, é liminarmente recusada. A situação política e social na Catalunha degrada-se a olhos vistos. Com estas escolhas, o governo espanhol e o Supremo Tribunal boicotam qualquer solução democrática para a questão catalã.

Sim, é mesmo do respeito por princípios básicos da democracia que se trata. Por mais que as autoridades espanholas proclamem que são uma “democracia”, os seus atos contradizem-nas todos os dias. Constituir como presos políticos dirigentes que foram eleitos, propor que sejam condenados a penas que podem ir até aos 30 anos de prisão, perseguir os exilados com mandados internacionais, não é próprio de uma “democracia madura”. Se somarmos a isso a violência policial e a repressão das manifestações, a coberto da chamada “Lei da Mordaça” aprovada em 2015, só podemos constatar que hoje, aqui ao lado, os mais elementares direitos democráticos se encontram, de facto, suspensos.

Há uma semana, o Comité de Direitos Humanos da ONU insistia que o Estado espanhol deveria com urgência “assegurar todos os direitos políticos de Jordi Sánchez” (o dirigente associativo que foi impedido de defender a sua candidatura à Presidência da Generalitat). No mesmo dia em que este apelo era feito, Jordi Turull (o novo candidato independentista à presidência) foi preso. É o modo do Reino de Espanha responder à ONU.

Perante isto, o silêncio quase generalizado da chamada “comunidade internacional” é um gesto lamentável de cobardia. O governo português pode invocar que não pretende ingerir-se em “assuntos internos” de outros estados, e os deputados da Direita e a maioria dos deputados do PS podem alinhar pelo mesmo diapasão. Porque o argumento é puramente circunstancial, a hipocrisia torna-se evidente. Dezenas de votos foram aprovados noutros momentos sobre situações de desrespeito pelos direitos humanos e pelos direitos democráticos noutros países. Agora, o silêncio e a conivência.

Não vale a pena mascarar de legalidade o que é um evidente atentado à democracia, independentemente do que cada um e cada uma possa pensar sobre a independência ou a autodeterminação da Catalunha. Nenhum problema político se resolve sem que haja a negociação de uma solução política. Por isso, o que está a acontecer é grave e é uma irresponsabilidade. Felizmente há quem, em Portugal como noutros países, não se cale. E exija o mais básico dos direitos: liberdade para os presos políticos catalães.

2 pensamentos sobre “Liberdade para os presos políticos catalães

  1. Para a esquerda radical, todos os actos praticados, são actos políticos, pelo que todos os presos, são presos políticos. Quem não se lembra dos tempos em que inocentes tombaram por acção de uma bomba colocada sem cuidar de atingir culpados, apenas com o intuito de espalhar o caos, a insegurança, o terror, como aconteceu com as FP25? Como podem crimes de homicídio, serem qualificados como crimes políticos? Poder podem, se o seu alvo for um político, mas nunca se o alvo for difuso e não tiver como destino um político. O Regicídio de D.Carlos é um crime político, mas o homicídio de gente anónima nunca o poderá ser. Crime, é apenas e só um crime.
    Pode alguém ser preso pelo delito de opinião? Claramente que não, e pior ainda se for um político.
    Pode alguém ser preso se incitar terceiros à rebelião, com violação de leis e consequente insegurança do Estado e dos seus cidadãos? Obviamente que sim. As leis existem para regular as relações entre cidadãos, para evitar que a lei do mais forte se sobreponha nesse relacionamento. Respeitar a lei será sempre uma obrigação social de todo o cidadão e revela respeito pelos outros cidadãos.
    Percebo que o BE tenha dificuldades em aceitar isto, já que as suas propostas de vida em sociedade não cativam milhões e, por isso nunca chegarão ao poder pela via de eleições, só o podendo fazer pela via revolucionária, um ideal que lhes ficou marcado desde a adolescência e que os acompanha, fazendo deles meros homens crianças.
    A Catalunha é uma Região Autónoma, com língua própria, órgãos de poder próprios, forças de segurança próprios e até bombeiros próprios. É o mais próximo que existe de um País independente, mas não é independente, nem existe qualquer razão para o ser. Se não gostam da monarquia, promovam um referendo nacional para fazer a escolha de tipo de governo que querem. Apesar de apenas 34% da população falar catalão, querem impor aos restantes 66% que passem a falar catalão? Se apenas 15% escrevem e compreendem catalão, querem impor aos restantes 85% que escrevam e entendam catalão? Onde está o respeito pelos outros? Onde está a democracia? Como podem reclamar vitória no Referendo, quando a pergunta era claramente capciosa e foi prometido aquilo que não existe? Neste impulso juvenil esquecem-se que existe amanhã, e que o amanhã seria diferente do hoje. A Catalunha é uma região rica? Sim, é. Mas continuaria a sê-lo depois? Claramente que não. A sua adesão à UE não tem viabilidade e nunca seria admitida, ficando transformada num ilhéu na Europa. Parceiros de negócio para sustentar o País (e é disso que vivem os Países, ou então teriam que onerar brutalmente os seus cidadãos com impostos) só os Países de Leste, África, Ásia, Oceânia e América, o que parece muito, mas que face às reacções já conhecidas e aos Acordos existentes entre a UE e eles, redundaria inevitavelmente num colapso financeiro em toda a linha,
    E voltamos ao impulso juvenil. É muito giro acordar e gritar que se quer a independência, como gritaram um dia em casa e disseram que estavam fartos de viver sobre as regras dos pais e iam viver sós. Mas um País move milhões, é responsável por milhões, relaciona-se com milhões, não se esgota na esfera individual.
    E é aqui que está a origem do mal. Regras. É muito diferente ser livre e viver em liberdade, do que viver sem regras. Viver sem regras não significa viver em liberdade, significa apenas recusar viver com os outros, e o Homem é um animal social que vive com os outros, como todos aprendemos no secundário. Quem quer viver sem regras, vive só e apenas para si, mesmo que tente arrastar milhões atrás de si. Talvez uma ilha seja mais adequado para quem assim quer viver.
    Quem apela e incita milhões à violação das leis Constitucionais, não busca mais do que uma revolução Constitucional e a desagregação, pelo que será sempre um preso de delito comum, por atentar contra a vida, segurança e bem estar de outros milhões, não será um preso político.
    Hoje a Catalunha, amanhã a Valónia, a Flamenga, os Córsagos, Jersey, Man, Baviera e por aí fora. A política do caos, do fim dos governos e da democracia, e sobretudo das regras. Nisto se consomem os objectivos dos apoiantes da independência da Catalunha. Ou alguém duvida que por um fenómeno de mimetismo se espalharia pela Europa fora?
    Há uma diferença abissal entre o que se quer e o que se pode ter. Entre os meus desejos e os desejos de milhões de pessoas. Entre o que me afecta a mim e a uma minoria e o que afecta a esmagadora maioria. É giro plantar estas ideias revolucionárias e ficamos para a História, mas será benéfico para a esmagadora maioria dos povos?
    Dava jeito pensar antes de reagir por impulso juvenil.

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