O Moita-Carrasco

(Por António Neto Brandão, 11/02/2018)

mARCELO_CEGO

Há um Marcelo que tudo vê e outro que é cego dos dois olhos. (Cartoon em Blog 77 Colinas)

Perante o maior escândalo judiciário do presente século o Venerando Chefe do Estado faz ouvidos de mercador.

Diz S.Exa que, vigorando o princípio constitucional da separação de poderes, não lhe é lícito pronunciar-se sobre questões que são do foro judicial. Bem prega frei Tomás! O palrador-mor do reino inibe-se de se pronunciar sobre questões judiciais em obediência ao princípio supra citado. Já usou o mesmo falacioso argumento – eu diria antes o mesmo foleiro argumento -, para evitar questionar o papel do Ministério Público no imbróglio vergonhoso em que se transformou o processo de Manuel Vicente, ex vice-Presidente da República de Angola. Mas quem é tão zeloso e escrupuloso no respeito pela separação de poderes constitucionalmente consagrada, não hesita diariamente, (às vezes mais do que uma vez por dia) em dar palpites, criticar, exaltar, depreciar, lixar a acção do Governo, que é, sabe-o ele bem, um órgão de soberania tão merecedor do respeito, pelo menos como os tribunais.
Quando falo no maior escândalo judiciário dos tempos que correm não me refiro ao infeliz e insólito caso do juiz-desembargador Rangel e Cia. Lamento sinceramente o sucedido pelo desprestígio que o facto em si mesmo pode trazer para a imagem da Justiça – que, para bem de todos nós, todos devemos preservar-, mas, independentemente do resultado que vier a saber-se no final, não deixo de verberar de forma vigorosa a escandalosa e contumaz violação do segredo de justiça que chega ao ponto de fazer com o CM esteja num local de buscas antes da chegada das autoridades. Vergonha!

E aqui sobra para a Exma. PGR que teve o desplante de, em intervenção pública recente, chamar a atenção para a brandura penal do crime de violação do segredo de justiça para daí concluir, vesgamente, que aí residiria, senão um incentivo à prática do crime, pelo menos uma desvalorização ético-social da sanção penal desinibindo os delinquentes da prática do crime. Culpa de quem? Do poder legislativo, obviamente…

A Sra. PGR esquece deliberada e conscientemente, ela que é uma jurista eminente e experiente, que a par de cada crime de violação do segredo de justiça existe sempre ou um crime de suborno, ou de corrupção, ou de furto, ou de peculato, ou de recebimento indevido de vantagem, ou de tráfico de influências, ou,…uma panóplia de crimes graves a exigir uma melhor diligência de quem é, em exclusivo, titular da acção penal.

Sobretudo quando se sabe que na quase totalidade das ocorrências as suspeitas vão para o próprio MP e para os serviços que dirige. Ou será que S.Exa ignora ou não desconfia que se alguém transmite ao CM ou a outro pasquim de igual quilate uma informação confidencial de um processo em segredo de justiça é porque recebeu gorjeta, prebenda, bónus, óbulo, favor, vantagem, suborno, etc…em troca do serviço? A não ser que o CM ou qualquer outro cano de esgoto tenha alguém infiltrado dentro do MP. Ou então alguém desses pasquins ande sistematicamente a assaltar os arquivos do MP. Mas a ser assim já estaríamos perante uma organização criminosa, tipo máfia. Nesses casos o recomendado seria chamar a polícia…

Voltemos á vaca fria, salvo seja.

O Ministério Público, segundo o próprio, com base em noticias dos jornais (CM, Expresso e quejandos) que referiam que o Ministro Mário Centeno pedira dois bilhetes para ir ver o Benfica (que falta de gosto), e que isso estava relacionado com o deferimento de um pedido de isenção de IMI requerida pelos filhos do Presidente do Benfica, decidiu instaurar um processo crime (de inquérito) e vai daí resolve irromper pelo gabinete do Ministro das Finanças da República Portuguesa e Presidente do Eurogrupo, e sacar dos computadores do ministério toda a informação e documentação que julgou relevante e pertinente.

Perante o clamor nacional de repúdio que a afronta feita ao Ministro e ao Governo da República causou em todo o país e a sua repercussão internacional o MP, honra lhe seja feita, em 5 dias arquivou o processo. Não vou aqui escalpelizar o processo, nem vou especular sobre as motivações de tão tonta quanto abstrusa iniciativa. Reservo-me para quando for discutido o estatuto do MP que, adianto já, me parece querer entrar em roda livre.

Não, o meu alvo é S.Exa o PR. Então S.Exa não tem nada a dizer ao Povo? Então um agente do Ministério Público, um funcionário subordinado da Procuradoria-Geral da República comete o dislate, a provocação de, sem o mínimo fundamento, sem o mínimo de razoabilidade lançar sobre um Ministro do Governo que S.Exa empossou e que pelo seu prestígio internacional foi alcandorado pelos seus pares da Europa a Presidente do Eurogrupo, o labéu, o enxovalho de SUSPEITO de corrupção e S.Exa fica-se? Não convoca a Sra. PGR e não exige dela uma explicação pública e um pedido de desculpas ao visado? Não lhe pergunta se foi ou não instaurado o competente processo disciplinar aos responsáveis pelo sucedido, quando é o próprio MP a reconhecer a argolada em que se meteu? E isto fica assim?

O PR que tem por função primordial assegurar o regular funcionamento das instituições não diz nada face a este gravíssimo entorse? Ele, que dá palpites a todo o instante sobre o Governo, que chega ao desplante de se imiscuir em assuntos meramente administrativos, e até de dar sugestões aos deputados da República sobre os sítios que eles devem ou não visitar, sobre os desmandos do MP cala-se, agacha-se, tem medo? O Povo português não lhe merece uma palavra de satisfação? Ou pensa que ele se basta com as beijoquices e as recomendações para usarem as torradeiras?…

Ó Marcelo. Catano!

7 pensamentos sobre “O Moita-Carrasco

  1. ou tem medo ou tem rabos de palha,coisa que não acredito,mas tem de tomar posição para não ser incongruente em relação ás posições que toma conforme bem refere.

  2. tem toda a razão.
    O sr ministro merecia um pedido de desculpas públicas e formais por parte da PGR.
    E o sistemático silêncio do PR só se justifica porque não há folclore nem beijinhos…

  3. Primeiro, considerar o post como dos mais assertivos que li sobre o comentador político Marcelo Rebelo de Sousa. Depois a dúvida. Será que a acção do MP foi da iniciativa da PGR, como resposta ao episódio recente da renovação do mandato da PGR, ou é consequência dos factos muito graves já coligidos em sede de inquérito relativos a um clube de futebol e ao seu Presidente, bem como a outros dirigente e ex-dirigentes do mesmo clube, que pela sua extrema gravidade levaram a PGR a admitir que o Ministro tivesse sido influenciado? É que se alguém pensa que o que está em causa nesse processo é só desporto, está redondamente enganado, e a prova está no lamentável caso Rangel, que deixou à vista a influência na justiça e, mais recentemente a abertura de um novo inquérito a oficial de justiça do DCIAP, por violação do segredo de justiça, com a remessa de peças do processo para o tal presidente, esclarece as razões de alguns casos de violação do segredo de justiça.
    Sabe-se que Mário Centeno é benfiquista (o que não estranho, pois como olhanense que fui nos meus primeiros dez anos de vida, recordo-me bem como vibravam os olhanenses dos sucessos do Benfica dos anos 60). Já agora, é bem verdade que nisso tem falta de gosto.
    Sabe-se que o jogo era de alto risco, o que se traduzia pela proibição da segurança em assistir ao jogo no meio da multidão.
    Sabemos agora que o filho de Vieira tinha problemas com o IMI.
    Também sabemos que não cabem a Centeno responsabilidades directas e imediatas sobre as taxas e pedidos de isenção ou redução das mesmas,
    Se nós sabemos, também a PGR e o OPC nomeado o sabe, pelo que se é uma resposta ao episódio da não renovação do mandato da PGR, é um golpe desajustado e que só confirma a teoria que a PGR não foi independente nos alvos escolhidos, sendo o caso mais flagrante o Caso Tecnoforma. Ou seja, foi em busca de lã e saiu tosquiada.
    Sobra a outra justificação, bem mais perceptível e razoável. Afinal, se cometem tráfico de influências com Magistrados, mais fácil parece ser cometer esse tráfico com Ministros, não é?
    Independentemente de todas as análises que possamos fazer, é certo que tarda a PGR justificar a razão porque colocou em causa o Ministro. Foi para provar que todos os cidadãos merecem o mesmo tratamento e atenção da PGR, não existindo cidadãos de primeira e de segunda? Como se no passado já o fez, demonstrando que são as cores que a guiam, não são os estatutos sociais?
    Como tarda o presidente verboso fazer o seu habitual comentário, senão em defesa do governo, pelo menos na defesa do prestigio do País.

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