.(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 22/12/2017)
As eleições catalãs realizaram-se perante um cenário que não pode ser aceite como normal. Não me refiro à polarização política que os resultados tão bem ilustram. Falo do facto dos líderes de dois dos três partidos mais votados estarem ou presos ou no exílio. Hoje ficámos a saber que é metade da Catalunha que está presa ou exilada.
Tem sido sublinhada a vitória dos Ciudadanos. É verdade que o partido liberal de centro-direita cresceu de 25 para 37 deputados, de 18% para 25,4%. Mas o primeiro lugar resulta apenas de um facto: ERC e Juntos pela Catalunha foram separados às urnas, quando nas últimas eleições tinham concorrido juntos. Na realidade, os Juntos pelo Sim tinha conseguido 62 deputados (39,5%) em 2015 e subiram, em separado, para 66 deputados (cerca de 43%). Mesmo o campo independentista, contado com a CUP (que desceu de 10 para 4 deputados), mantém a percentagem quase inalterada. O primeiro lugar do Ciudadanos pode servir de consolação, mas ficou tudo na mesma. Mesmo que os independentistas tivessem perdido a maioria, só era possível governar com o Catalunya en Comú, o Podemos catalão. E estes, que têm sido erradamente colocados no mesmo bloco que Ciudadanos, PSC e PP, nunca se aliariam a estes partidos, já que defendem o direito à autodeterminação e se opuseram a toda a estratégia de Rajoy. Ou seja, um governo liderado pelo Ciudadanos e apoiado pelos espanholistas nunca chegou a ser uma possibilidade.
Estas eleições têm, antes de tudo, um derrotado: Mariano Rajoy. Tudo o que fez não teve qualquer resultado. Nem a repressão, nem as prisões, nem a antecipação das eleições. Os catalães mobilizaram-se para deixar tudo na mesma. E para tornar o PP ainda mais irrelevante na Catalunha: vale agora pouco mais de 4% (tinha 8,5%) e tem três deputados. Mas a derrota da Rajoy não é o PP ser um partido marginal na Catalunha, é o resultado da sua estratégia de força. Ela valeu-lhe apoios em Espanha e secundarizou o PSOE, é verdade. Mas, no dia seguinte às eleições, a sua posição é insustentável. Vai fazer o quê? Continuar a usar a força? Manter os líderes dos partidos que têm de formar governo presos e no exílio? Continuar a criminalizar a maioria democraticamente eleita? Retirar o poder ao parlamento acabado de ser escolhido numas eleições que ele próprio marcou?
É muito mais grave do que isto. Ao tentar transformar um problema político num problema judicial, Mariano Rajoy decretou que os legítimos representantes dos catalães – agora reforçados por novas eleições – não eram seus interlocutores. E ele próprio se colocou numa posição insustentável perante os catalães, tratando-os como criminosos. O que Mariano Rajoy fez, apenas pensando em vantagem de curto prazo, foi erguer um muro à volta da Catalunha. A sua irresponsável mão de ferro pode ter agradado a muitos espanhóis mas tornou muito mais difícil a resolução deste problema. Os resultados deixaram tudo na mesma, mas a renovação da maioria que Rajoy quis criminalizar muda tudo.
Os resultados têm um problema e uma oportunidade para os independentistas. O problema é a divisão a meio do seu eleitorado, impedindo uma liderança clara neste bloco. A oportunidade seria a de substituir a CUP pelo Catalunya En Comú, deixando de estar amarrado à declaração unilateral de independência e construindo uma ponte com a ponderação e a construção de consensos.
Na França de De Gaule, assim como na África do Sul dos Afrikanders, os mapas eleitorais foram desenhados para favorecer maiorias conservadoras. No caso da Catalunha o mapa eleitoral foi desenhado (há uns 40 anos atrás) e com a complacência do governo de Madrid, de modo a favorecer maiorias independentistas. Acontece que, como em Espanha não havia fronteirtas internas, ao longo das décadas houve centenas de milhares de «imigrantes» oriundos de outras regiões/autonomias de Espanha. Os «indígenas» estão hoje em minoria (tal como no País Basco), pelo que o voto pela independência (47,52%) beneficiou largamente do voto anti-Rajoy, o qual foi de facto o grande derrotado… Mas, na Catalunha, quem ganhou mesmo foi a Direita (cerca de 70%) dos votos. Tristes tempos.
E agora?
Agora tem de voltar a marcar NOVAS VOTAÇÕES até que a MANADA de escravos boçais compreenda o que devem fazer e COMO DEVEM VOTAR!