Acusação a Sócrates: de que era acusado em 21 de Novembro de 2014?

(Por Estátua de Sal, 11/10/2017)

socrates_acusado

Saiu finalmente a acusação a José Sócrates, e dizem que são resmas e resmas de papelada. Crimes e crimes em profusão, ainda que o grosso da acusação se prenda com a existência de corrupção por favorecimento dos desígnios de Ricardo Salgado nos negócios da PT. E sendo assim, isto é muito, muito grave, e dá razão aos que sempre disseram, mormente Sócrates, que a sua prisão configurava um ataque político da direita prosseguido pelos dignatários da Justiça.

Na verdade, no dia em que foi preso, 21 de Novembro de 2014, a Justiça nada tinha em seu poder que pudesse ligar Sócrates a Ricardo Salgado que nessa altura, apesar de já ter sido destituído da Presidência do BES devido à aplicação da medida de resolução ao banco em 3 de Agosto do mesmo ano, ainda mantinha incólume o seu perfil de “dono disto tudo”.

Também nada tinha que o ligasse a um eventual negócio de luvas decorrente da concessão de licenças e financiamento ao empreendimento de Vale de Lobo. Apenas tinha vagas suspeitas de que Sócrates poderia ter sido corrompido pelo Grupo Lena, tendo em conta ter detectado transferências de dinheiro de Carlos Santos Silva para José Sócrates que este sempre alegou serem empréstimos que recebera do seu amigo.

O que irá ser o desfecho do Processo Marquês, o tempo o dirá. Mas, pela ausência de provas à data da sua prisão, para já o que pode concluir-se, é que a prisão de Sócrates foi de todo forçada e, sendo um ex-primeiro ministro, foi seguramente usada como arma de arremesso político para atacar Sócrates e o PS: fugas selectivas para os jornais, quebras sistemáticas do segredo de justiça, tudo orquestrado ao milímetro e publicado no “tempo certo” e na dosagem necessária. Em suma, a pulhice institucionalizada, abrangendo uma promiscuidade mafiosa entre a política, a justiça e a comunicação social.

Vivemos, para usar a célebre classificação de Guy Debord, na sociedade do espectáculo, ou seja, e citando o autor: “Toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de espectáculos. Tudo o que era directamente vivido se esvai na fumaça da representação.”

E assim se passou. Foi espectáculo a prisão de Sócrates com as televisões em directo. Foram espectáculo durante meses as visitas que recebeu na cadeia de Évora. Foi espectáculo o seu regresso a casa, é espectáculo a emissão de hoje, quase em contínuo das televisões com especialistas de todos os matizes a opinar sobre a acusação finalmente parida. Irá ser espectáculo durante meses o julgamento que se seguirá.

No meio das narrativas que nos vendem e dos espectáculos que nos encenam (e onde somos encenados, as mais das vezes sem de tal termos consciência), onde está a realidade? Onde está inocência ou a culpabilidade do arguido? A resposta é óbvia: na sociedade da actualidade, refém de uma mediatização amiúde obscena, a realidade é a imagem, a mensagem, a realidade é o espectáculo.

O Direito, o primado da lei sobre a barbárie, começou por ser uma construção lógica fundada na inteligibilidade devedora da racionalidade dos sujeitos pensantes. Mas hoje, na sociedade do espectáculo, a aplicação da justiça começa a ser mais fundada na capacidade dos magistrados encenarem a prova, usando a força mediática da comunicação social sobre os cidadãos, do que propriamente em a produzirem em juízo.

É difícil avaliar os perigos que decorrem desta deriva, deste desvio, nas sociedades livres e democráticas, mas eles são, do meu ponto de vista, enormes e só podem redundar em totalitarismos mais ou menos larvares e em situações de arbítrio kafkiano.

E pergunto de novo: onde está inocência ou a culpabilidade do arguido? Como muitos dos opinadores das televisões sugerem, a prova é sólida, e o mais espantoso é que medem a solidez da prova, que não conhecem, pela quantidade de páginas (4000) do libelo acusatório! Ou seja, o julgamento já começou também ela a ser encenado pela voz do comentariado nacional.

Já agora, deixo só algumas perplexidades em relação ao que já se conhece da acusação:

  1. Provas de corrupção não existem ou não são apresentadas nem se sabe em que se fundamenta a acusação de corrupção – factos, documentos, testemunhos, ganhos provados e quantificados a favor do corruptor activo.
  2. Existem fluxos financeiros que circularam entre vários dos acusados e, surge sempre a sentença lapidar que é: “O ministério público acredita, bla, bla, bla”. Parece que o Ministério Público é uma entidade religiosa, que tem fé e que acredita. Qualquer um pode acreditar na Nossa Senhora, nos pastorinhos, em gambuzinos ou no Abominável Homem das Neves. Assim, somos convidados a seguir a “fé” do Ministério Público e a sermos seus reverenciais prosélitos.
  3. E parece que os nossos amigos jornalistas, são todos eles homens de fé e todos eles estão ajoelhados à rezar o terço do Ministério Público.
  4. Finalmente há outro crime que é imputado aos arguidos e que é ridículo. Trata-se do crime de fraude fiscal. Quer dizer, supostamente Sócrates e os outros arguidos receberam verbas ilícitas. Pois bem, são também condenados por não terem declarado essas verbas em sede de IRS e pago os impostos respectivos! Ou seja, tendo supostamente beneficiado de dinheiros ilícitos eram obrigados a denunciar-se e a pagar os impostos associados a essa ilicitude. Isto só pode ser uma acusação demencial do tal fiscal de Braga da Autoridade Tributária, que desde o início, muito discutivelmente, é um dos investigadores da dita Operação Marquês.

Finalmente, a sanha e a gana com que a direita e os seus porta-vozes estão a sublinhar o caso na comunicação social, no actual momento político,  e tendo em conta o timming – que com esta Justiça nunca é acidental e/ou inocente -, são um pouco estranhas.

A não ser que estejam a antecipar problemas com a aprovação do próximo Orçamento de Estado e a emergência de uma crise política de todo inesperada, onde explorariam o caso Sócrates até à náusea.

O PCP e o BE que se cuidem e não coloquem António Costa entre a espada e a parede, exigindo aquilo que é manifestamente impossível na actual correlação de forças a nível da Europa e tendo em conta a conjuntura económica e financeira do próprio país.

Que não façam com António Costa aquilo que fizeram com Sócrates e com o PEC IV em 2011. Seria um tiro no pé mais explosivo que um míssil intercontinental, um completo suicídio político.  Como diz o adágio, à primeira qualquer um cai, mas à segunda só cai quem quer.

 

13 pensamentos sobre “Acusação a Sócrates: de que era acusado em 21 de Novembro de 2014?

  1. Só alguém perfeitamente ILUDIDO esperaria que o Lixo Público não debitasse acusação!

    De resto, agora que a TENDA DO CIRCO está montada, e pronta a ser utilizada por tudo o que é salafrário (ESTADO é entidade salafrária suprema e seus funcionários, agentes e outros que tais são os responsáveis por tal estado!) para ir debitar as anedotas… Podemos novamente contar com mais um belo desperdício de dinheiro público para entreter a MANADA de boçais que continua, feliz e contente, a VOTAR em salafrários! E se acham que é exagero… Olhem para Oeiras!

    Todos os que VOTAM têm de estar absolutamente e continuamente CALADOS e sem MUGIR, pois são estes idiotas que andam a fazer cruzes em folhas de papel, que estão a SUSTENTAR esta GLORIOSA PODRE DEMOCRACIA!

  2. O PCP e o BE não podem ser de esquerda e os trabalhadores que continuem a empobrecer, porque é o que a seriedade manda – pró caralho com isso. já há 3 partidos a favor da luta pelos salários abaixo da sobrevivência.
    Quanto ao crime de não pagar IRS, foi assim que foi apanhado outro mafioso famoso também, embora com o processo a decorrer dentro da lei e da constituição.

  3. «O PCP e o BE que se cuidem e não coloquem António Costa entre a espada e a parede, exigindo aquilo que é manifestamente impossível na actual correlação de forças a nível da Europa e tendo em conta a conjuntura económica e financeira do próprio país.
    Que não façam com António Costa aquilo que fizeram com Sócrates e com o PEC IV em 2011. Seria um tiro no pé mais explosivo que um míssil intercontinental, um completo suicídio político. Como diz o adágio, à primeira qualquer um cai, mas à segunda só cai quem quer. »

    Ó Santo Deus!?!?…. tentar dar lições a um partido com quase 100 anos de existência, com 48 de guerra aberta e contínua ao fascismo salazarento, onde todos os seus membros se orientam pelo marxismo, praticamente único sobrevivente do “abraço do urso” onde caíram os espanhóis, os franceses e os italianos, só para citar os que, pela proximidade e peso que tiveram, nos serão mais familiares e estarão mais frescos na memória, tentar dar lições ou conselhos, a este partido, para que pare com a defesa dos trabalhadores – afinal a sua razão de ser e até o seu acatar – vindo de um pequeno-burguês que se reclama de ser também (como eu) contra o capitalismo, NÃO LEMBRAVA AO DIABO, ó amigo Estátuadesal. Por isso, permita-me que lhe aconselhe também a si:

    Meu caro Estátua, acalme-se, por favor e em seu favor e para seu bem!…e deixe funcionar as (também suas) instituições democráticas, pois estamos no (também seu) estado de direito democrático (tudo com letra minúscula, propositadamente, porque de “dejectos” do capitalismo se trata, roubando agora o termo ao Ilustre e por vezes eloquente comentador aqui na Estatuadesal, sempre muito lesto no ataque/crítica aos que atacam/criticam os “socialistas de boca” de que o Zézito [coitado, eu às vezes até tenho pena dele, como se eu fosse alguém para ter pena de quem tem idade de ser meu filho, que desceu um dia ainda moço lá das berças do luso interior – tal como o duarte lima, o vara, o dias loureiro, e tantos outros figurões de que o defunto político e ex-vidente de Massamá é um dos últimos espécimes – mas falemos agora do Zézito – vindo de uma CM onde como Eng. Técnico já podia assinar projectos de arquitectura auferindo por cada projecto valores médios que rondavam as centenas de contos, vestia-se e vivia sobriamente como qualquer trabalhador por conta de outrém, era filho de uma modesta senhora que descontava para a SS como doméstica (sobre vencimentos na ordem dos 300 euros) de que alcançou uma reformazita, etc., etc., e, de mala feita, chegou à estação da CP para apanhar o comboio (da política que garantiria sempre um melhor nível de vida do que andar de calças de gines, desde que a ética e a honestidade se deixassem à porta quando se entrasse, claro, e de que já era um bom exemplo o “grande mestre” que se vendeu ao Carluchi para mamar uns milhões da CIA, depois arrancou da Alameda – numa manif por sinal organizada pelo actual chefão da ONU que há dias ficou numa fotografia que se tornou viral nas redes sociais pelo ar de subserviência evidenciado por esse figurão perante o seu patrão – o miserável (de espírito, claro) do Trump, um gajo que é presidente da (ainda maior economia do mundo e da maior máquina de guerra também, um gajo que num debate em directo para todo o mundo disse à H. Clinton, quando esta o acusou de criminoso fiscal, de que o ele ter sido capaz de fugir ao fisco da maneira que sempre fugiu para fazer a fortuna que tem só era revelador da sua inteligência!?!?… – depois pôs o Socialismo (plasmado na nossa CR, porventura a mais progressista do planeta Terra) na gaveta para se manter com o POTE ao seu alcance, enfim, ao tempo (em que o Zézito chegou à tal estação da CP) estaríamos já em 1983, tempo em que uma camarilha tipo matilha alcateiada tomou as rédeas do poder e formaram o chamado “bloco central de interesses”, também conhecido pelo “arco da governabilidade”, onde surgiram todos os empregados (que mais tarde com esse merda do pide de Boliqueime viria a ser designado de “o monstro” que até o próprio Miguel Cadilhe identificaria esse merda do pide como o “pai do monstro”, e em que a oligarquia dos 3 partidos ditos “socialista” “social/popular democrata” e “democrata cristão” (aí se o Cristo viesse cá abaixo!?!?…) era quem pagava os ordenados e lhes davam os empregos e foram aqueles que em 1983 tomaram conta disto tudo e acenando ao pobre luso Zépovinho com o papão do comunismo assustaram estas fortes gentes que não merecíamos “Reis” tão fracos como todos esses filhos de puta, sacaram tudo a estes paspalhos da classe média (à qual, ouso supor, o amigo Estátua pertencerá) que votaram neles (e os pobres que não votámos apanhámos por tabela) e mantiveram o forrobodó, mandaram vir do estrangeiro os Espírito Santo, os Melos e Champalimonds, entregando-lhes de mão beijada, com pedidos de desculpas e até com brutas indemnizações tudo o que no 11 de Março do fascista spínola lhes havia retirado graças à saudável inspiração do GLORIOSO 25 DE ABRIL quando sob a batuta dado CR onde pontificam Homens como Costa Gomes e Vasco Gonçalves, foram nacionalizados os Seguros e Bancos, spínola esse, fascista e criminoso de guerra que também viria a ser chamado (quando ainda andava no estrangeiro para onde fugiu com 2 helicópteros e diversas armas e munições militares a conspirar contra ABRIL) a regressar, em vez de julgado e condenado pelos crimes cometidos, foi reintegrado nas Forças Armadas, promovido a Marechal, condecorado e até tem ruas com o seu nome; ao mesmo tempo, foi esta escumalha formada por estas mesmas elites burguesas capitalistas e reacionárias que viriam a fazer com que o saudoso Saramago (modesto jornalista de profissão, também ele provinciano e ribatejano como eu) fosse viver para Lanzerote mas, nem assim evitaram que ele viesse a ser laureado com o que tanto vem ambicionando, e há tanto tempo, um tal ilustre citadino médico de profissão que foi também um sempre presente “Ilustre mandatário” de algumas candidaturas presidenciais burguesas e capitalistas (mas não na de Sampaio da Nova, pois claro, era o que faltava!…).
    Mas voltando ao Zézito, que é o que está a dar agora para este meu comentário, por essa altura, anos 80 do séc. passado, tomava ele o comboio já em andamento para a capital, tendo entrado logo para a primeira carruagem que viu cm a porta aberta, e nem reparou que era a carruagem do então já ppd/psd, conseguiu sentar-se, aliviou um pouco dos efeitos da sua proletária passagem pela CM e das horas extra a assinar projectos que sempre lhe ajudavam mais um pouco a viver melhor – caramba, já era tratado por Senhor Eng., pois engenheiro técnico custa mais a dizer e leva muito mais tempo d que só Eng.- e tentou “passar pelas brasas” para mais facilmente reiniciar o sonho que qualquer jovem tem para o seu futuro. Mas, passado algum tempo, não muito, diga-se, acordou com o barulho que os laranjinhas iam fazendo, sempre alegres e contentes pelo futuro assegurado, e reparou então que já tinham entrado mais uns quantos candidatos aos lugares que o Zézito ambicionava e com os quais sonhou. Esperto como é, logo pensou que com aquela concorrência toda, a subida aos lugares de topo estava mais dificultada, pelo que resolveu sair daquela carruagem e, já na estação seguinte, com o apito para a partida do comboio já a soar, virado de frente para o comboio, escolheu a carruagem à sua esquerda e entrou nela. Teve então todo o tempo para sonhar, subir e até chegou ao epíteto de “O Menino d’Ouro” lá da agremiação do Rato, pois até ganhou a primeira maioria absoluta. E foi ganhando, e ganhando, e, porque dotado de bom coração, não esqueceu os amigos, que também foram ganhando, ganhando, e agora estão todos, ou quase – pois, neste processo, eu tenho para mim que ainda a procissão não saiu da igreja, e espero muito francamente que o Ricardito (o tal que garantiu aos deputados que “o dono disto tudo é o Povo português” venha a pôr a boca no trombone e mostre todos os documentos que tem em seu poder ou sabe onde estão!…
    Por tudo isto, meu caro Estátua, e mais o que poderei escrever a seguir, mas agora estou exausto e tenho que voltar às obrigações profissionais que, porque nem da classe média espremida pelos pafiosos sou, ainda vou mantendo pois só a pensãozita não dá para tudo, pelo tenho ainda que bulir, e aqui voltarei porque, finalmente já há acusação, e o meu amigo já fala em virar para trás e quer condenar quem meteu o Zézito no comboio dos criminosos há 3 anos atrás, se…se…. Ó amigo Estátua, está coisa do se é uma pôr da, sabe!…é como diz o Povo: “se…, ainda era viva, aminha avó coitadinha!”. Pelo que este seu artigo me deixou triste, não por mim, claro, mas pela surpreendente surpresa que experimentei por vir do meu amigo (virtual, é certo, mas que eu tinha por companheiro de luta contra este hediondo sistema de sociedades onde o capitalismo é dominante e que germina estes miseráveis fenómenos, só ir isso) Estátua!…
    Mas eu aqui voltarei e tentarei comentar mais sobre este presente de Natal antecipado que o meu papai Natal me quis trazer agora, e que vai constituir-se como que uma suave quanto agradável massagem no meu ego de alma lusa e de ribatejano puro, com pédigri, onde os bois se chamam pelos nomes, e todos eles têm nome.
    Naturalmente que ainda não li a acusação para me poder pronunciar, mas admito que o meu amigo Estátua também não o teria lido, pelo que, por agora e para já, deixo aqui um cheirinho do que penso poder vir a desenvolver em tempos vindouros e que desejo sejam breves:
    Que trabalho minucioso e todo ele muito bem feito
    E perante políticos tão ladrões e sempre sem jeito
    Mas tão admirados por gente reles de consciência
    E que bem os ajudaram na sua tão reles demência…

    Entretanto (as novas tecnologias têm destas coisas) amigo Estátua, chegou-me esta prosa que, sem conhecer ainda o autor, que até pode ser pior que o Zézito, admito, pois a direita capitalista e burguesa tem de tudo um pouco, mas que eu subscrevo, assino por baixo e desejo desenvolver e complementar com os elementos que tenho, dos quais alguns tenho direto conhecimento pois já ando cá desde 1944.
    Abraço, do
    aci

  4. Meu caro Estátua,
    Reparo agora que o cansaço me impediu de transcrever um texto que me enviaram há pouco e que se enquadra perfeitamente no que penso sobre este mega caso, pelo que me penitencio e o transcrevo a seguir, repetindo-me que o subscrevo integralmente e assino por baixo.
    Mas eu quero aqui voltar para falar/escrever sobre o seu (brilhante) parágrafo onde escreveu: «O Direito, o primado da lei sobre a barbárie, começou por ser uma construção lógica fundada na inteligibilidade devedora da racionalidade dos sujeitos pensantes.»
    Que “Direito”?… o direito burguês de Kelsen?…
    … uma construção lógica?…mas que lógica?… a aristotélica?…
    ….inteligibilidade devedora da racionalidade?????… que racionalidade?… será que o capitalismo (que esse seu primado vem alimentando e sustentando desde sempre, fornicando os fracos e enaltecendo os fortes) tem alguma racionalidade enquanto sistema económico-social dominante????…
    Veremos depois como é, mas agora vou mesmo descansar, porque não aguento mais, deixando a seguir o dito texto, que não me interessando de quem vem, mas sim pelas verdades que contém, subscrevo:
    { O que o despacho de acusação nos mostra é que este não é um mero caso de Justiça, é muito mais do que isso. Mostra até onde chegou a concentração de poder e a sofreguidão do duopólio Sócrates-Salgado.
    São quatro mil páginas que ainda exigem tempo para ser digeridas. Mas tudo o que delas já resulta não deixa lugar a muitas dúvidas: a investigação do Ministério Público demorou muitos meses, mas produziu acusações pesadas e sólidas.
    Desde o dia em que José Sócrates foi detido no aeroporto de Lisboa sabíamos que não seria fácil. O que logo nessa altura se percebeu sobre a complexidade da teia em que se apoiava e os mecanismos usados para disfarçar a forma como lhe chegava o dinheiro era suficiente para perceber que os investigadores teriam um trabalho árduo e que, se era fácil demonstrar que o antigo primeiro-ministro tinha um modo de vida de todo incompatível com o que declarava serem os seus rendimentos, ou os seus “empréstimos”, seria muito mais difícil provar a relação entre esse dinheiro e decisões que tivesse tomado enquanto primeiro-ministro.
    Quase três anos depois, muitas contas bancárias passadas a pente fino e uma investigação que se alargou a outros centros de poder – em especial o que tinha à frente o antigo “dono disto tudo”, Ricardo Salgado –, temos hoje um despacho de acusação com pés e cabeça. Vai ser possível provar tudo em tribunal? Veremos, conhecendo como conhecemos a dificuldade de o fazer no nosso país (e antecedentes históricos como os casos Isaltino e BPN). Mas há que reconhecer que o Ministério Público foi muito mais longe do que alguma vez fora no passado.
    Será no entanto um erro reduzir este caso à sua componente jurídica e à troca de argumentos entre advogados e juristas. O que este despacho de acusação nos revela – no fundo, o que esta investigação trouxe à luz do dia – foram os detalhes de como o concubinato entre o poder político e o poder económico criou o caldo de cultura ideal para projectos de poder que não olham a meios nem têm limites éticos.
    Nos anos em que José Sócrates foi primeiro-ministro assistiu-se em Portugal a um esforço de concentração de poder sem paralelo na nossa história democrática. O primeiro-ministro não tolerava quem lhe fizesse frente, fosse no partido, fosse no Governo, fosse na comunicação social, fosse até na economia.
    A memória dos povos tende a ser curta, a minha não. Recordo-me bem daquele que foi, porventura, o primeiro sinal de que Sócrates atropelaria quem fosse preciso atropelar para alcançar os seus objectivos: a nomeação de Armando Vara para a administração da Caixa Geral de Depósitos, uma nomeação que foi o pretexto próximo para a demissão do seu primeiro ministro das Finanças, Campos e Cunha. Colocou na CGD um amigo e cúmplice, Armando Vara – e hoje começamos a conhecer, graças a este processo, até onde ia essa cumplicidade –, e ao mesmo tempo via-se livre de uma voz incómoda no Conselho de Ministros.
    Também me recordo bem como foi controlando ou desvitalizando os organismos independentes, do regulador da comunicação social ao da energia; como meteu no bolso – não consigo encontrar termo melhor – o presidente do Supremo Tribunal de Justiça e o procurador-geral da República, que lhe prestariam inestimáveis serviços noutros casos em que esteve envolvido (lembram-se da destruição das escutas?); como tratava a comunicação social, chegando a conseguir que a notícia sobre a sua licenciatura, dada inicialmente pelo Público que eu então dirigia, fosse silenciada durante uma semana; como intimidava os que discordavam dele dentro do PS, uma história ainda por contar; ou ainda como comandava ferreamente, a partir do seu gabinete, toda a comunicação do executivo.
    Mais importante e mais relevante, não posso esquecer a forma como os seus trataram de tomar conta do sistema bancário, com o assalto do BCP, para onde passou o sempre inestimável Armando Vara; e como depois disso usou esse poder para tentar fechar um dos poucos órgãos de informação que então o incomodavam, o Sol; como procurou instrumentalizar a PT para que esta comprasse a TVI e calasse uma jornalista desalinhada; como usava as “golden shares”, nessa PT ou na EDP, para prosseguir os seus projectos mitómanos; e por aí adiante.
    Neste percurso deu-se um cruzamento improvável de interesses: os de um primeiro-ministro todo-poderoso com o chefe de uma família de banqueiros habituada, porventura como nenhuma outra família em Portugal, ao concubinato com o poder. O que resultou desse cruzamento de interesses resultou num desastre para Portugal – a queda do Grupo Espírito Santo quando desapareceu o amparo dos contribuintes e a virtual destruição de um grupo como a PT, engolida por um negócio ruinoso no Brasil que fora imposto pelo próprio José Sócrates.
    Esta espécie de “duovirato” durou vários anos, envenenou a política portuguesa, contaminou o sistema económico e contribuiu para uma claustrofobia que poucos tiveram a frontalidade de denunciar. Só a crise acabaria por separar o “animal feroz” do “dono disto tudo”, mas nessa altura a dimensão dos problemas já escapara ao controlo e à capacidade de ambos.
    Agora que conhecemos o “saco azul” por onde passaram muitos dos milhões que olearam estas relações, os seus negócios e os seus interesses, é importante ter bem presente que, antes de o dinheiro circular, havia quem prosseguisse uma concentração de poder que não era boa para o nosso sistema democrático e que era péssima para o nosso tecido económico. E quem pudesse levar vida de rico sem ter rendimentos legítimos para isso.
    Estou convicto que aquilo que já sabemos, tal como aquilo que o Ministério Público já pode mostrar para sustentar a acusação, é apenas uma parte, porventura uma pequena parte, dos abusos que foram cometidos na busca de mais e mais poder – ou de mais e mais dinheiro. Sinceramente gostaria de não me enganar quando penso que a procissão ainda vai no adro. Isto é, que os muitos segredos que esta teia ainda tem por revelar não ficarão esquecidos e serão um dia revelados.}

    Nota pessoal: Há verdades que doem, mas também há verdades que curam, e como ensinou o grande Mestre Vitor Hugo: “As palavras têm a leveza do vento, e a força da tempestade”.

    Um abraco, do
    aci

    • Caro anticapitalista

      Há certas alianças que são interessantes. Você critica todas as eminências do capitalismo que você abomina. Eu também, já agora. Mas, como sabe, o capitalismo não tem uma liderança homogénea: há interesses contraditórios e que concorrencialmente se degladiam. Ou seja, qquando você ataca os interesses que Sócrates, supostamente corporizava, em termos da liderança do sistema capitalista em Portugal, à época, você, curiosamente é aplaudido pelos interesses que se opunham, também à época, a essa liderança. É curioso. E não podemos evitar cair nessa armadilha. Ainda assim, prefiro os interesses que Sócrates corporizava do que aqueles que se lhe opunham, tendo em conta que, sempre que atacamos um dos pólos de hegemonia do sistema, o pólo que se lhe opõe de imediato nos aplaude. Um abraço.

  5. Espantoso, tudo o que arrazoa!
    Espero que se tenha convencido a si próprio, com as suas próprias alegações. Os leitores, duvido…

    • A si nunca. No caso de Sócrates você sofre da “doença” do João Miguel Tavares. Até lhe fica mal e não vai muito bem com outro “tom de pele” saudável que se lhe conhece. 🙂

    • Pois, acredito que se espante, mas o problema é tanto seu como o arrazoado é meu, e eu prefiro tomar parte do que criticar com o habitual blá blá de quem não tem argumentos para o que designa por “as suas próprias alegações”, mas que, como diria o Luís: «verdades puras são e não defeitos», pelo que, se o Senhor fosse honesto, fácil seria rebater, com as suas verdades, o meu arrazoado, mas, pelo que pressinto, doeu-lhe, e como deve lidar mal com a verdade, não só não se deixou convencer, como até tem dúvidas que de que “Os leitores, duvido”. O outro, agora defunto político a caminho do jazigo que ele próprio mandou edificar, quem sabe se seu correligionário, também se pôs a adivinhar e depois deu no que deu, e agora resta-vos a esperança de um Rio ou um Lopes, velhos e conhecidos barões sem brazão histórico significativo, para renovar o partido dito “popular” e “social democrático” que tem parido alguns dos “fracos reis” que têm feito fraca a tão forte Gente Lusa a que me orgulho de pertencer.
      Mas, continue e siga em frente no apoio a essa escumalha dos pafistas pafiosos, pois não vai sozinho, e como ensinou a saudosa Simone: «O opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos.»

      • Corrigenda, se…:
        Li agora o comentário da Estátuadesal onde escreve o nome desse miserável escriba da côrte (um dos muitos que vão andando por aí) JMT, assim como escreveu o “tom de pele”, pelo que deduzirei então que o comentário do leitor Senhor Abílio Matos não era dirigido ao meu comentário, e se assim é, cumpre-me apresentar as minhas desculpas ao Senhor Abílio, ao mesmo tempo que retiro o que escrevi, dado que não tem destinatário.

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