Rui Rio e o piscar de olho do bloco central 

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 06/10/2017)

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Se Rui Rio for escolhido para a liderança do PSD, prevejo, por o que conheço do seu discurso, duas linhas de ação só aparentemente contraditórias: um conjunto de propostas demagógicas sobre o sistema político e funcionamento dos órgãos de soberania (que ele partilhou em várias conferências e que imagino venha a moderar no despautério quando passar a ser assessorado) e uma aproximação ao velho bloco central, com o regresso do PSD à sua velha matriz ideológica. Aparentemente antissistémico em matéria política, aparentemente centrista em matérias económicas e sociais.

É na tentativa de aproximação do PSD ao PS que Rui Rio fará a diferença. A moderação do PSD, em matérias económicas e sociais, desdramatizaria o perigo do seu regresso ao poder e deslaçaria um pouco mais a unidade da geringonça

Este casamento é, do ponto de vista dos interesses do PSD (não necessariamente os do país), virtuoso. Permite afastar o PSD da radicalização a que se entregou nos últimos anos e, ao mesmo tempo, tentar captar voto disperso e descontente. Sem comparações de realidades e personagens totalmente diferentes, Donald Trump provou que é possível, em campanhas políticas, representar o sistema com um discurso antissistémico.

Mas é na tentativa de aproximação do PSD ao PS que Rio fará a diferença. Por três razões:

O primeiro efeito é o da desdramatização. À esquerda ou à direita os processos de unidade são sempre pragmáticos e, de alguma forma, negativos. Se fosse mais do que isso, a unidade transformar-se-ia em fusão. No caso da geringonça, a unidade é, como sabemos, bastante precária. A moderação do PSD em matérias económicas e sociais desdramatizaria o perigo do regresso do PSD ao poder e deslaçaria um pouco mais a unidade da geringonça. Mostrando-se disponível para entendimentos pontuais já nesta legislatura, isso contribuiria para diminuir a dependência do PS em relação aos seus parceiros à esquerda, contribuindo para reduzir as lealdades interpartidárias.

O segundo efeito é dar espaço político aos opositores da geringonça dentro do PS. Até agora os críticos da geringonça no PS confrontam-se ou com a indisponibilidade do PSD para entendimentos ou com a impossibilidade programática e ideológica desses entendimentos. Deixariam de ter essa dificuldade. E o problema mais sério viria de alguns sectores do governo que não são entusiastas desta solução e que, à primeira oportunidade, tentarão confirmar que se pode dispensar o PCP e o BE. Uma opção mais fácil quando, a liderar o PSD, estiver alguém que tenha abandonado o discurso da ilegitimidade de Costa.

O terceiro efeito é menos relevante, mas conta alguma coisa: retiraria espaço para o CDS se afirmar como partido moderado da direita (essa tentativa foi evidente em Lisboa ou na opção que tomou em Loures), empurrando-o para uma linha mais identitária.

Quer isto dizer que Rui Rio representa, para a saúde da geringonça, um verdadeiro desafio. Curiosamente, também representa uma vantagem: um líder do PSD que torne menos provável uma maioria absoluta do PS obriga António Costa, que tem a consciência que os entendimentos à esquerda são a única hipótese de libertar o PS do destino dos restantes partidos socialistas europeus, a reforçar as relações com o PCP e o BE.


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2 pensamentos sobre “Rui Rio e o piscar de olho do bloco central 

  1. É caso para dizer; – olhe que não! Tem que rever os seus conceitos, o CDS da amazona Cristas
    obteve menos votos do que em 2013, nas ultimas eleições a votação que alcançou em Lisboa
    fica a dever-se à nulidade apresentada pelo PSD! Quanto ao PCP está a ser vítima do seu imo-
    bilismo ideológico e, as facilidades por acomodação em certas Câmaras !!!

  2. E a diminuição de votos na CDU tem qualquer paralelo com a diminuição de votos na Direita? Somos tótós e queremos que os outros sejam?

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