Ética e combate à evasão fiscal

(In Blog O Jumento, 04/03/2017)
evasao
Uma das reacções dos partidos da direita ao escândalo das transferências para as offshores foi a tentativa de promover Paulo Núncio como um herói nacional pelo combate à evasão fiscal. O próprio director-geral da DGCI e depois da AT, que exerceu funções durante a maior parte do mandato fez o elogio dos resultados quando foi ouvido no parlamento, chegou mesmo a exibir um PC com um gráfico invisível, onde se demonstrava que os resultados nos impostos eram superiores aos da evolução da economia.
É verdade que os resultados das receitas fiscais ficaram acima da evolução da economia, a questão agora é saber se este “milagre” terá resultado das decisões de gestão do DG, dos dotes político-partidários de Paulo Núncio ou de outros factores. É um facto que uma boa parte desses resultados resultam do e-Fatura, projecto que não foi invenção nem do DG, nem do governante. Curiosamente o e-Fatura poderia ter ido mais longe na promoção do combate à evasão fiscal, mas talvez tenha faltado a coragem.
Mas a grande verdade é que o aumento da receita fiscal, indicador de sucesso para dirigentes e governantes em tempos de crise, esconde outra realidade,  combate à evasão fiscal, que devia promover a justiça e a equidade fiscal podem esconder uma realidade perversa, ao aumento das receitas fiscais em resultado do combate à evasão fiscal não corresponde necessariamente mais equidade e justiça fiscal.
O aumento das receitas fiscais ocorre nos dois impostos onde mais subiram as taxas, IRC e IVA, o sucesso nas receitas não resulta apenas dos dotes do DG e da visão do governante. O governo aumentou os impostos mais suportados pelos menos ricos e mais fáceis de cobrar. Não é preciso o e-Fatura para cobrar o IVA sobre a electricidade, e muito menos para ajudar a cobrar imposto automóvel ou ISP.
Não há registo de um grande sucesso na cobrança do IRC, imposto que devia baixar, como meio de promover a desvalorização fiscal. Também não há notícia de grandes sucessos na detecção de fraudes fiscais. Compreende-se, é mais fácil cobrar impostos a pobres do que a ricos, os pobres não tugem nem mugem, não recorrem aos tribunais e são fáceis de assustar por uma estratégia de terror fiscal.
Uma das medidas mais significativas deste período foi o aumento para 5.000€ do patamar a partir do qual se pode recorre das decisões do fisco para os tribunais. Isto significa que se  um pobre se sentisse lesado e na possibilidade remota de recorrer dessa decisão o seu juiz seria o director-geral,  ou seja, o chefe máximo de quem cometeu o erro. Isto significa que durante o mandato de Paulo Núncio, para além de pouco se fazer para cobrar impostos aos ricos, chegou-se ao cúmulo de reservar os juízes independentes da máquina fiscal aos ricos, enriquecendo escritórios de advogados e empaturrando os tribunais com receitas por cobrar, que foram compensadas com uma maior perseguição fiscal aos menos ricos, influentes e poderosos.
A máquina fiscal impôs-se pela modernização resultante de grandes investimentos feitos antes desta geração de políticos e dirigentes, beneficiou da modernização da economia, mas também tirou proveito do medo dos contribuintes. Há dois tipos de contribuintes, os ricos que não receiam a máquina fiscal e que podem recorrer aos juízes, e os pobres que estão nas mãos das decisões dos chefes dos serviços de finanças e que foram perseguidos de todas as formas possíveis.
Numa democracia ao aumento da eficácia do fisco deveria ser acompanhada pelo aplauso de quem cumpre com os seus deveres de cidadania e vê um Estado a actuar com equidade e justiça. Não foi isso que Paulo Núncio implantou ou mandou implantar, foi criada uma máquina que se impões aos pobres pelo medo, que fez vista grossa aos ricos e que ao mesmo tempo que ganhou credibilidade técnica, perdeu a consideração dos cidadãos. É o preço de se ignorar valores como a ética a justiça e a equidade, na gestão do Estado.

2 pensamentos sobre “Ética e combate à evasão fiscal

  1. Ética, moral, justiça e equidsde na actuação de capitalistas e seus serventuários??????…..ah ah ah…
    Só por ingenuidade, ó amigo Jumento.
    Eles são vampiros, eles se alimentam do sangue, suor e lágrimas dos trabalhadores. Só o trabalho cria valor, através da mais-valia produzida por quem trabalha!….
    Atente-se na posição do patronato, os representantes do capital, logo os capitalistas, a que devemos juntar os lacaios voluntários tais como os núncios, os duques, os caiados, os gomes ferreiras, os camilos lourenços, e toda a seita de jornaleiros escribas da corte que vão ganhando a vida a convencer o Zépovinho pagante (dos exagerados impostos também) de que vivemos de forma justa, e, em nome de valores tão nobres e até sublimes como a liberdade, a democracia e o socialismo, vão impondo, desde há mais de 400 anos, a exploração capitalista que nos conduziu à dramática situação em que vive já o planeta Terra, em que 1% da população detém tanta riqueza quanta têm os outros 99%, ou as 7 (sete) famílias mais ricas detém 50% de toda a rqueza gerada. Mais grave ainda: equanto a idolatria do deus dinheiro permitiu tudo isto, em cada minuto que passa, morrem 17 crianças com fome e subnutrição?!?!….
    Mas quem denuncia o capitalismo? Quem ou quais evidenciam estas verdades factuais? Quem semeia na sociedade a certeza de que é o capitalismo, enquanto sistema económico-social dominante, o responsável pela situação em que vivemos????

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