O estranho caso da dívida pública

(Marco Capitão Ferreira, in Expresso Diário, 04/01/2017)

 

Durante anos fomos ouvindo que os cortes de pensões e salários no sector público se tinham de manter para garantir a consolidação das contas públicas. Que os enormes aumentos de impostos sobre os trabalhadores eram indispensáveis. Que o caminho, mesmo que nos estivesse a conduzir na direcção oposta, era o único, e portanto tínhamos de perseverar.

Segundo o Banco de Portugal, entidade pouco suspeita de ser amiga de que se desprove aquele quadro conceptual, que é o seu, em novembro de 2016, a dívida pública situou-se em 241,8 mil milhões de euros. E diminui em relação ao mês anterior. Chocante.

Ao contrário do que o PSD nos foi prometendo (ou ameaçando, depende do ponto de vista), isto significa que a dívida pública não só não está descontrolada como diminuiu quer em termos brutos quer em termos líquidos neste final de ano.

Isto são boas notícias para o País e más notícias para os que anseiam por más noticias para o País para verem o seu programa político viabilizado.

É óbvio que este não é o fim de nenhum caminho. A dívida pode ter diminuído 1,3 mil milhões de euros relativamente ao final do mês anterior, mas não deixou de continuar a estar estabilizada um pouco abaixo dos 130% do PIB, um nível que pesa na Economia Portuguesa de uma forma decisiva.

A opção política de fazer depender o financiamento dos Estados europeus dos mercados, juntamente com as fragilidades da solidariedade europeia, para sermos simpáticos, tornam os estados soberanos especialmente vulneráveis a níveis elevados de dívida pública misturados com pressões deflacionistas, baixo crescimento e elevados desempregos. Situação em que se encontra mais de metade da Europa.

Atribuir a situação portuguesa apenas às suas condições internas (que existem, e não se podem negar) é de uma miopia política que não cessa de surpreender.

As alternativas são poucas, mas têm de passar pelo tema tabu: não podemos continuar num sistema disfuncional. Mais não seja para ganhar tempo – a estratégia favorita da Europa – alguma reestruturação da dívida pública terá de acontecer. Em público, privado, com esse nome ou outro. Isso pouco importa. Esse é um dos desafios para 2017. Que não haja discussões proibidas.

Fonte: Expresso | O estranho caso da dívida pública

5 pensamentos sobre “O estranho caso da dívida pública

  1. Marco Capitão Ferreira. Excelente.
    Todos deviam ver a saga dinamarquesa Follow the Money (A Fraude) RTP2 às 22:00. Terminou ontem. Mas deve aparecer em DVD. É ficção porém toda a ficção é idealizada pelo ser humano e o mundo financeiro é igualmente um produto da criação humana!

  2. Caro Marco,
    Obrigado por este seu artigo que, no essencial, subscrevo.
    Permita-me, porém, um pequeno reparo, com o antecipado lamento pela extensão do texto:
    Tudo o que o Senhor Marco descreveu, e muitíssimo mais, é fruto do sistema económico-social, que gira sob a designação de capitalismo, mas de que ninguém, ou quase, parece querer falar e ou escrever, como, por acaso, é o seu caso, no caso deste artigo seu em que, com alguma boa vontade, se poderia vislumbrar um tímido arremedo nesta expressão que o Senhor utilizou «… : não podemos continuar num sistema disfuncional.».
    Como, ouso supor, o Senhor Marco também saberá, há até quem o considere “uma forma de vida natural”, pelo que as suas (intrínsecas, porque lhe estão no “ADN”) crises, que são apresentadas (aos incautos votantes “Zés-povinho”, como apresentadas são as leis da mãe Natureza), quantas delas autênticas catástrofes de que são expoentes máximos as crises de 1929 e, agora a de 2007/2008, esta ainda sem solução à vista, antes pelo contrário.
    Mas, paradigmaticamente, enquanto a mãe Natureza vinha dizimando os mais frágeis, sem contemplação, os seres da espécie humana, ao longo dos milénios, foram conseguindo fazê-los sobreviver e realizar-se como seres humanos, sair das leis da selva e da barbárie e construir aquela espécie de milagre que designamos por Civilização, consubstanciada no conjunto dos pomposamente designados Direitos Humanos, sempre tão propagandeados pelas diferentes direitas [ desde Mário Soares, o maior charlatão da política que já conheci desde há mais de 50 anos a esta parte, até George Walker Bush, passando pelo Augusto Pinochet, F. Sá Carneiro, Pinto Balsemão, Adriano Moreira, Margaret Thatcher, o “sr. Silva”, Almeida Santos, Jaime Gama, Freitas do Amaral, Ângelo Correia, Dias Loureiro, Isaltino de Morais, Duarte Lima, Miguel Cadilhe, António Guterres, Durão Barroso, Felipe González Márquez, José Maria Aznar, Tony Blair, Santana Lopes, Francisco Assis, Manuel Monteiro, José Sócrates, Augusto Santos Silva, Carlos Costa, ‘a ti’ Teodora Cardoso, Assunção Esteves, Pacheco Pereira, Jorge Braga Macedo, Pina Moura, Eduardo Catroga, Passos Coelho, antigo Paulinho das Feiras, Miguel Relvas, Vítor Gaspar, Miguel e Paulo Macedos, a senhora de Albuquerque, Nuno Melo, David W. Donald Cameron, Miguel Frasquilho, Luís Montenegro, Nuno Magalhães, Sérgio Monteiro, Marinho e Pinto, a senhora Cristas, ‘o doutor Rebelo de Sousa’, Donlad Trump, …( & Cia), pelas diferentes direitas, escrevia eu, mais ontem, do que hoje, é verdade, na medida em que o muro já não existe ].
    Mas, prezado Marco, quer o Senhor queira, ou não, sem a alteração/substituição deste hediondo sistema económico-social [ que há mais de 400 anos invadiu, ocupou, explorou, roubou, escravizou, deportou matou, dizimou, dividiu países contra a vontade dos Povos, fez duas guerras mundiais e tantas outras regionais, idolatrou (mais recentemente) o deus dinheiro, tendo também esta sua última actuação se caracterizado por descartar os idosos, os que não têm alternativa a viver senão do trabalho, os jovens e até as crianças, ao ponto de conseguir que os tais 1% já detenham tanta riqueza quanta possuem os outros 99% da população do planeta ], sem a alteração/substituição, escrevia eu, não vislumbro como o Senhor Marco vai poder deixar de considerar mais vezes o seu “Chocante”, enquanto continuar a confundir, digo eu, «…uma miopia política que não cessa de surpreender.», com a má-fé de gente ignorante e impreparado, de medíocre curriculum mas elevada capacidade de marionete, quão dotado de uma certa prosápia de espertalhão e autoconvencido mas que nem o Filipe La Féria nele acreditou, e a quem, nem aos pais obedeceu para vir vivenciar o ambiente nocturno das “Docas de Alcântara, em Lisboa, onde sorveu os mais qualificados inputs de adequada preparação e cultura para o desempenho de altos actos públicos, enquanto, de dia e durante mais de cinco anos, sobrecarregou os ombros do famigerado doutor (da mula russa) Miguel Relvas, para subir na vida, servir, servilmente a, ‘tia’ Angela Merkel e seu deficiente MF, durante quatro anos e mais uns pozinhos que o famigerado pide militante de Boliqueime (um tal gente que tem que nascer duas vezes para liquidar o IMI de uma data de anos da luxuosa vivenda que o amigo Oliveira e Costa & Cia lhe facilitaram no acesso, que raramente tem dúvidas e que nunca se engana, …) lhe quis proporcionar (mas que, ao dito pide pafioso, lhe veio a custar ter que engolir mais sapos que os pobres dos camaradas comunas tiveram que engolir uma certa vez numas presidenciais), para, posteriormente, vir a afirmar-se como o iluminado vidente de Massamá, e que, outro dia, passou também a usar o cognome de Irrevogável II, mais conhecido pelo PM no exílio que teima em usar uma bandeirita na lapela dos casacos que veste!…
    O Senhor Marco não irá ler este meu desajustado (porque não adequado à moda que grassa por este vale de lágrimas a que chegou, também, a lusa media) escrito, mas se, por ventura (na perspectiva da cidadania e alguma intenção pedagógica, ainda que humilde, devo reconhecer) viesse a ler, eu tomava a liberdade, de novo com a mesma humildade, de lhe sugerir uma reflecção, por pequena que fosse, sobre esta temática do capitalismo (que tem existência real e até já é quase meio milenar, mas que, de certeza, digo eu, não é eterno), versus o que, historicamente, se lhe seguirá, qualquer que seja a designação que lhe quiserem dar.
    Com votos sinceros de continuação de um bom ano, com mais outros novos e bons artigos, cordialmente, seu, e ao dispor,
    anticapitalista incorrigível
    (há mais de 50 anos)

    • Caro anticapitalista. Porrada de criar bicho, o seu texto. Tem razão em quase tudo. Continue a comentar e a mandar recados aos comentadores da nossa praça. Não é que mudem mas pode ser que passem a dormir pior. Nunca se sabe… 🙂

      • Caríssimo Estatuadesal,
        Primeiro, e ainda, continuação de um bom ano, pois essa treta de só desejar coisas boas até 06.01, eu não comungo.
        Depois agradecer o ter lido, bem como o apoio e incentivo visando o futuro, mas, como o meu amigo saberá, admito, sempre que tenho ocasião, eu tento contribuir para alterar “estas coisas” da história, como o velho das barbas me ensinou, pois, apenas ficar pelas análise e interpretação, é de bom tom para os burgueses e alguns burguezotes que da manutenção do status retiram seus proventos, se bem que alguns até julgam (ou estão convencidos) que retiram, mas, no fundo, bem vistas as coisas, também sofrem enquanto vítimas da exploração capitalistas (refiro-me aqui aos burguezotes, porque os grandes DDTs esses sempre beneficiam).
        Por último, e porque referiu “Tem razão em quase tudo”, antecipadamente grato e penhorado ficaria se me ajudasse a corrigir o resto, pois detesto que me tenham por vendedor de banha da cobra ou, sequer, que vendo gato por lebre, tão ao jeito do maior charlatão que mencionei no meu comentário e que, a partir de ontem já não mais aldrabará mais.
        Não tem que ser hoje, naturalmente, mas quando dispuser aí de um tempinho, ajude-me lá a corrigir, porque, como diz o outro, só os burros é que não mudam.
        Aquele abraço, do
        anticapitalista incorrigível

        • OK. Vai ter que me dar tempo e oportunidade para “parir” um texto sobre o tema que publicarei aqui de forma autónoma mas que identificarei como a propósito do seu comentário. Está prometido para breve.

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