As sondagens valem o que valem

(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 25/11/2016)

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Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa devem estar contentes. Uma sondagem coloca-os, ao primeiro como um dos presidentes mais populares de Portugal, e ao segundo como líder de um partido que está à beira da maioria absoluta. Mas o mundo está demasiado perigoso e instável para que deitem foguetes. Tudo pode mudar rapidamente e para novas eleições falta ainda muito tempo.

Primeiro, o Presidente da República. É verdade que Marcelo sucede a um Presidente que saiu de Belém com a mais baixa taxa de popularidade de sempre – nota média de 7,7 e apenas 48% de avaliações positivas em Dezembro de 2015, segundo a sondagem do Centro de Estudos e Sondagens de Opinião (CESOP) da Universidade Católica. É verdade que Marcelo era amplamente conhecido da generalidade dos portugueses devido às suas intervenções televisivas dominicais. É verdade que Marcelo é hiperativo. Mas não é apenas isso que faz a popularidade do Presidente. É seguramente a maneira como tem procurado contribuir para a estabilização política do país, não sendo, a partir de Belém, um foco permanente de guerrilha e instabilidade como foi Cavaco em relação a governos que não fossem da sua cor política. E é por isso que Marcelo arrasa: 16,3 valores, numa escala de zero a 20, e 97% de notas positivas. É o reconhecimento de que Marcelo tem sido um enorme Presidente do ponto de vista político, mas sem deixar de manter uma enorme ligação afetiva aos portugueses e mostrando igualmente o seu interesse por outras áreas de atividade como a cultura, a ciência ou o desporto.

Por sua vez, António Costa bem pode sorrir. Depois de ter perdido as eleições para o PSD em 4 de Outubro de 2015, tirou da cartola uma solução governativa para o país que ninguém imaginava. Trouxe para as responsabilidades governativas (ou para o apoio às decisões do Governo) o Bloco e o PCP, que nunca tinham estado em tal posição desde que o sistema democrático parlamentar estabilizou em Portugal. Conseguiu satisfazer várias reivindicações sociais e laborais desses parceiros, mantendo ao mesmo tempo os compromissos europeus de redução do défice e de apresentação de um excedente orçamental primário. Vai, aliás, conseguir que Portugal saia este ano do Procedimento por Défice Excessivo, atingindo o défice mais baixo em 42 anos de democracia, um valor que deverá ser suplantado no Orçamento de 2017. Evitou as sanções em Bruxelas e fez passar com facilidade na Comissão o OE/2017. Depois de três trimestres a agoniar, a economia deu um ar da sua graça no terceiro trimestre do ano, crescendo 0,8% em cadeia e 1,6% em termos homólogos, os melhores resultados desde há três e um ano, respetivamente. Está a haver crescimento do emprego e redução do desemprego. Os portugueses tem um pouco mais de dinheiro nos bolsos e o país está claramente mais distendido. E cala para já os críticos internos a esta solução governativa (Francisco Assis, Sérgio Sousa Pinto), ao mesmo tempo que vê o PS crescer nas intenções de voto e aproximar-se da maioria absoluta, sem que isso signifique uma derrocada eleitoral do BE ou do PCP.

Motivo para os dois abrirem o champanhe? Seguramente é cedo demais para o fazer. Há muita instabilidade política no horizonte europeu, há muita instabilidade económica que está para vir do outro lado do Atlântico. O menor dos males será a subida das taxas de juro a nível global. O pior será uma guerra comercial, que trave a fundo o comércio mundial. Mas também o fim das compras dos títulos de dívida pública pelo BCE ou a descida do rating da dívida pública portuguesa seriam dramáticos para o país. E a bomba atómica seria a implosão da União Europeia, se em vários países europeus os populistas e xenófobos de extrema-direita ascendessem ao poder durante as diversas eleições programadas para 2017.

Ate lá, contudo, Marcelo e Costa podem, pelo menos, beber um bom vinho português. A vida, neste exato momento, corre-lhes de feição e está de espaldas para os seus adversários.

2 pensamentos sobre “As sondagens valem o que valem

  1. Este artigo tem um erro inaceitável: Após as eleições a solução governativa foi determinada pelo PCP quando afirmou “que o PS só não é governo se não quiser”, quando o PS já tinha reconhecido a “vitória” do PSD. Portanto, quem sacou da cartola a possibilidade desta solução governativa foi o PCP e não António Costa como refere este artigo.

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