Novo Banco, velhas mentiras

(Pedro Adão e Silva, in Expresso, 05/09/2015)

Pedro Adão e Silva

                    Pedro Adão e Silva

Se ninguém tinha dúvidas quanto à complexidade do problema, porque se anunciou um mundo de facilidades para o Novo Banco?

Se recuarmos um ano, uma coisa é certa: não havia boa solução para o colossal problema que foi a falência do BES. Aliás, das três então disponíveis — liquidação, nacionalização ou resolução —, há motivos para pensar que a resolução era a menos má. Há também outra coisa que sabemos: a perceção da complexidade do problema estava bastante disseminada. Depois de 2008, ninguém continuou a alimentar ilusões pueris sobre o padrão comportamental presente na gestão do sistema financeiro e passámos a ter consciência da impotência da missão dos reguladores. Afinal, ao sistema financeiro é possível praticar ilícitos e estar sempre vários passos à frente da supervisão.

É certo que houve falhas na ação do Banco de Portugal, pelo menos no ano e meio anterior à resolução e continua a ser inexplicável o aumento de capital final e a sucessão de omissões e decisões opacas naqueles meses fatídicos em que o caso BES foi gerido ao sabor de conveniências políticas, devidamente articulado com a saída da troika. Apesar de tudo, o que é isso comparado com o que se passou no GES e no BES?

Se ninguém tinha dúvidas quanto à complexidade do problema ou às exigências que se colocavam à regulação, por que razão se anunciou um mundo de facilidades e de soluções indolores para o Novo Banco?

Nada como recordar. Enquanto Passos Coelho afirmava, “o que não vai voltar a repetir-se, é serem os contribuintes a serem chamados à responsabilidade”, Maria Luís Albuquerque garantia que “os contribuintes não terão de suportar os custos da decisão tomada”, para dias depois assegurar que “os contribuintes receberão de volta o seu montante”.

Resulta evidente que a questão não é tanto a opção pela resolução, mas a tentativa tosca de nos enganar a todos, quando era preferível tratar os portugueses com maturidade em lugar de alimentar ilusões pueris. Há aqui um padrão e um propósito.

O padrão é a mentira como recurso político sistemático. Tem sido sempre assim com Passos Coelho desde que se alçou a líder do PSD. É como se em todos os momentos não se hesitasse em defraudar a ténue confiança que os portugueses ainda depositam na classe política. Era possível tratar os portugueses com maturidade?

Sim, era; mas o propósito é sempre sacrificar tudo em nome dos interesses táticos circunstanciais, mesmo que com custos materiais e para a credibilidade das instituições no futuro.

Foi sempre claro que o banco bom não era assim tão bom, que as exigências de capitalização seriam significativas e que o desfecho da litigância é imprevisível. Por melhor que corram as negociações, os 4,9 mil milhões investidos não serão recuperados integralmente. De uma forma ou de outra, haverá um grande impacto nas contas públicas e no sistema financeiro. De uma forma ou de outra, os contribuintes serão chamados a pagar. Se assim é, por que razão nos enganaram, uma vez mais?

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