O regresso do dr. Barroso num cavalo grego. Mas não o de Tróia

(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 03/07/2015)

nicolau

Durão Barroso regressou ontem à política portuguesa, aproveitando o lançamento do livro de Miguel Relvas e Paulo Júlio. Aproveitou para branquear a imagem da troika e a visão contabilística dos problemas europeus que predominam na Eurolândia e no FMI. Elogiou os homens dos aparelhos partidários, dando como exemplo Miguel Relvas. E finalmente pôs nos píncaros o primeiro-ministro: sem Passos Coelho, Portugal teria sido outra Grécia.

Não se pode dizer que Durão Barroso seja um mestre do disfarce. O que de repente descobriu é que esta crise grega não só pode levar a coligação PSD/CDS a ganhar as próximas eleições legislativas, como sobretudo ele próprio passou a ter de novo possibilidades de ser o candidato da maioria à Presidência da República. Para isso, precisa em primeiro lugar que Passos Coelho leve o PSD a apoiá-lo na corrida a Belém. E, se tal acontecer, precisa de alguém que domine o aparelho do PSD. E essa pessoa é Miguel Relvas. Daí a sua presença no lançamento do livro do ex-ministro, daí o rasgado elogio a Relvas.

O que isto prova é, em primeiro lugar, que Durão Barroso pensa que os portugueses não têm memória. E em segundo que, tendo alguma, conseguem ver o que se passou nos últimos quatro anos segundo a sua ótica.

Barroso ou vai para Belém ou ficará por aí a dar aulas e conferências, por cá e lá fora, não ascendendo a mais nenhum cargo político de relevo. O mundo é muito injusto

Será bom que Barroso seja o eleito de Passos para Belém. Isso permitirá fazer um balanço dos longos anos que Barroso esteve à frente da Comissão Europeia. Permitirá, por exemplo, constatar que foi com Durão Barroso que a Comissão Europeia perdeu o seu papel de fiel da balança na construção da União Europeia e entrou num claro declínio no quadro das suas instituições. Foi com ele que Bruxelas deixou de ser quem dava a mão aos países mais pequenos. Foi com ele que a Comissão Europeia passou a ser totalmente subserviente das teses alemãs. Foi com ele que Bruxelas assistiu impávida ao eclodir da crise grega, demorando muitíssimo tempo a reagir – e só o fazendo depois de Berlim ter decidido atuar. Foi com ele que se anunciou que a crise de 2008 não contaminaria a Europa. Quando isso aconteceu, foi com ele que se decidiu que os Estados deveriam meter dinheiro em força na economia, em Parcerias Público-Privadas e em investimentos de proximidade (recuperação de escolas, aposta nas energias renováveis). Foi com ele que, dois anos depois, as orientações de Bruxelas mudaram radicalmente, passando a redução do défice a ser o alfa e omega da cartilha de Bruxelas. E quando vários países disseram que tinham feito o que o presidente tinha dito e escrito, Durão Barroso veio candidamente dizer que meter dinheiro na economia era só para quem podia – o que é extraordinário, porque quem podia era quem menos precisava ou não precisava de todo… Foi Durão Barroso que não apoiou a criação de uma agência europeia de rating, para combater a ditadura das quatro grandes, que agravaram em muito a crise europeia, embora durante longos meses tivesse estado em cima da mesa um projeto da Roland Berger. Foi Durão Barroso (por decisão de Angela Merkel, claro) que deu o seu aval ao famoso PEC IV de José Sócrates – e ficou irritado quando Passos Coelho chumbou o documento na Assembleia da República e lançou o país em eleições, de onde saiu um novo ciclo político.

Muito mais factos haverá seguramente para recordar se Barroso vier a candidatar-se a Belém – o que se prepara para fazer, aliás, porque apesar de ter brilhado tanto à frente da Comissão Europeia, ninguém o convidou para mais nenhum cargo internacional.

Por isso, Barroso ou vai para Belém ou ficará por aí a dar aulas e conferências, por cá e lá fora, não ascendendo a mais nenhum cargo político de relevo. O mundo é muito injusto. Por isso, Barroso reentra na corrida a Belém a cavalo da Grécia. Mas sem a subtileza, o engenho e a arte do cavalo de Tróia.

9 pensamentos sobre “O regresso do dr. Barroso num cavalo grego. Mas não o de Tróia

    • Caro Nicolau Santos que oiço cada dia na Antena 1 , sabe tão bem como eu que dr Durão Barroso, foi escolhido a dedo justamente para fazer aquilo que denuncia : um papel de lambe-botas da alta finança… A Europa ultra liberal não queria ninguém capaz de equacionar as consequências sociais das suas decisões ! E de pensar que este citadão começou a sua carreira política no MRPP não deixa de ser burlesco, não acha ?

  1. “Elogiou os homens dos aparelhos partidários, dando como exemplo Miguel Relvas. E finalmente pôs nos píncaros o primeiro-ministro: sem Passos Coelho, Portugal teria sido outra Grécia.”……….que falta de vergonha,que servilismo,que bajulice…que NOJO …. Barroso…!!!😡😡😡😡😡😡😡

  2. Só há uma coisa a emperrar : as suas previsoes -no caso dos resgates e defices têm saido todos furados como sabem melhor que eu. Falta pouco para conferir mais este vaticinio tão bem elaborado.

  3. Barroso não voltou mas se voltasse seria mesmo no Cavalo de Troia. Ou seja, seria escondido atraz da mentira, tal como saiu, deixando a Legislatura a meio. O Cavalo de Troia acabo por trazer-nos para presidente aquele a quem os “Troianos” se irão arrepender de terem votado…

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