Porque mente Passos?

(Pedro Adão e Silva, in Expresso, 27/06/2015)

Pedro Adão e Silva

                     Pedro Adão e Silva

Passos Coelho mente por razões singelas: compensa, habitou-se e o empenho que coloca na repetição de mentiras revela que se foi convencendo da veracidade do que diz.

Quando questionados sobre qual o atributo que associam a Passos Coelho, os portugueses escolhem “mentiroso”. Como em relação a outras dimensões, as sondagens são um bom barómetro de perceções e um retrato preciso da realidade. Afinal, o primeiro-ministro não hesita em mentir quando lhe é politicamente conveniente. Foi o que aconteceu na campanha eleitoral, com promessas e garantias abandonadas à primeira oportunidade (o que está abundantemente documentado no YouTube para memória futura) e tem sido assim ao longo da legislatura com o que o próprio qualificou de “mitos urbanos”.

A questão que se coloca, hoje, não é tanto avaliar a extensão das mentiras do primeiro-ministro, é tentar perceber porque mente Passos Coelho?

A resposta mais simples tem também potencial explicativo. Passos Coelho mente por razões singelas: compensa, habitou-se e o empenho que coloca na repetição de mentiras revela que, muito provavelmente, se foi convencendo da veracidade do que diz.

E mentir compensa por razões atendíveis. No passado funcionou e, uma vez eleito, a capacidade política do primeiro-ministro não ficou particularmente beliscada por ter feito um campanha eleitoral baseada numa mentira colossal. Afinal, os portugueses apresentam uma justificada fadiga em relação à classe política e partem do pressuposto de que mentir é da natureza da atividade. Com consequências: falar verdade não é uma qualidade muito valorada no momento do voto. Como aliás demonstram as sondagens, a mentira como arma política não é muito penalizante. Caso contrário, alguém que é visto como mentiroso não teria intenções de voto elevadas.

A ascensão ao poder de Passos assentou numa mentira. E uma disputa eleitoral é sempre uma reinterpretação do que se passou durante a legislatura

No entanto, a explicação fundamental talvez seja de outra natureza. Passos Coelho mente, para dar exemplos dos últimos dias, sobre emigração, aumento de impostos e cortes nas prestações sociais porque lhe é permitido e é politicamente útil.

Permitido, em parte, porque há uma estranha timidez no momento em que a oposição tem de responder ao primeiro-ministro. Uma mentira é uma mentira e não uma “falta à verdade” e, talvez, só o histórico de mentiras que a oposição carrega aos ombros explique tamanha inibição.

No fundo, mentir é necessário e eficaz. Desde logo porque a ascensão ao poder de Passos Coelho assentou numa mentira fundadora sobre a natureza da crise e as suas manifestações em Portugal, que não pode ser abandonada a meio do percurso. Mas, acima de tudo, porque uma disputa eleitoral é sempre uma reinterpretação do que se passou durante a legislatura. Numa asserção conhecida, George Orwell sublinhava que “quem controla o presente, controla o passado e quem controla o passado controla o futuro”. Ora, sendo possível a Passos Coelho mentir hoje, fá-lo como forma de reescrever o passado, mobilizar os seus eleitores potenciais e, desta forma, tornar viável o seu futuro político.

6 pensamentos sobre “Porque mente Passos?

  1. São todos iguais. Desde o maior ao mais pequeno.
    Hoje os políticos servem-se da arte de mentir e roubar para proveito próprio.
    Já não se pode acreditar em nada nem em ninguém. Como se não bastasse favorecem os amigos.

  2. Este artigo escrito por quem andou com Sócrates ao colo é de rir à gargalhada. É um facto que Passos mentiu, prometeu e não cumpriu, mas entre a maior parte das promessas que estão no You Tube e ida para o governo o país faliu, foi amarrado a um resgate, viu países fortes como o nosso principal parceiro comercial, a Espanha e outras grandes economias com a Itália ou a França serem arrastadas para o meio da crise da dívida soberana, herdou o rasto de destruição criminoso do governo anterior etc. Não é desculpa, mas é muito diferente de aumentar salários e baixar impostos para logo de seguida tirar tudo em triplicado, não porque o dinheiro fosse preciso para atingir metas ou cumprir compromissos, mas simplesmente para se fazer TGV, aeroportos, PPP, Swaps, dar rendas etc. Foi isto que Sócrates de quem Adão e Silva foi conselheiro fez, mas Sócrates não mentia, não era mitómano e por isso o Pedro Adão e Silva não teve qualquer problema de consciência em o aconselhar e em o ajudar a fazer programas de governo, e isso diz tudo sobre ele.

    • O seu comentário é uma pérola. Passos mentiu, e continua a mentir descaradamente. Para si a questão é saber quem mentiu mais ou quem mentiu menos. Vamos supor que Sócrates mentiu mais. Isso não iliba que o artigo esteja certo. Sócrates está preso e não governa agora. Passos governa e o dever de um comentador é escrever sobre os vivos e não sobre os mortos. Você e os que pensam como você não querem discutir os vivos mas os mortos, não querem discutir o presente mas o passado. Sabe que, tanto assassino é quem mata 1 pessoa como 5 pessoas. Mas para si, quem mata uma não é assassino porque há quem mate mais. Com gente que argumenta dessa forma não vale a pena discutir. Dá mais vontade de tomar um comprimido para o enjoo.

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