ANATOMIA DA ACTUAL SOCIEDADE PORTUGUESA

(Amadeu Homem, in Facebook, 14/06/2015)

Amadeu Homem

     Amadeu Homem

A actual sociedade portuguesa pode dividir-se em dois grupos de criaturas : o grupo dos que trabalham, devido à reprovável circunstância de não saberem ganhar dinheiro, e o grupo dos que não carecem de trabalhar, devido à favorável circunstância de não lhes ser aplicável o anátema bíblico, segundo o qual se tem de ganhar a vida com o suor do rosto.

O grupo dos que trabalham subdivide-se, por seu turno, entre os que se devotam a trabalhos manuais “pouco qualificados” – tais como carpinteiros, pintores da construção civil, fresadores, torneiros, montadores de cofragens, serventes de pedreiro, mulheres a dias, mulheres a noites com mais de quarenta anos e outras ocupações congéneres – e os que se aplicam a trabalhos intelectuais de nulo interesse social – tais como professores, amanuenses, advogados não inseridos em sociedades do ramo, jornalistas desligados do “marketing” dos magistrados, contabilistas de pequenas empresas e demais ocupações afins. Os integrantes deste grupo apresentam, habitualmente, os bolsos em estado de laceração, atendendo à ocorrência de neles se acolherem moedas de valor invariavelmente inferior a cinquenta cêntimos.
No lado oposto da pirâmide social, encontramos os que ganham sem trabalhar. Neste grupo bem-aventurado alinham-se alguns juízes – que demoram uma média de dez anos para despacharem os respectivos processos – advogados-chefes de sociedades do ramo – que colocam os estagiários a fazerem todo o trabalho graciosamente ou, no máximo, na base do pagamento do ordenado mínimo nacional – deputados, sobretudo os que deveriam mudar a terceira vogal de “a” para “e”, despachantes dos “vistos gold”, acompanhantes femininas de secretários de estado com menos de vinte e seis anos, ex-governantes anichados em conselhos de administrações de empresas, pelos mesmos favorecidas, enquanto tenham sido membros do governo ( e que tenham tido o senso de não atacarem, nesse interim, as regalias dos senhores magistrados – caso contrário estariam todos presos, tal como o José Sócrates), eurocratas, servidores dessa “grande pátria europeia” , cujo préstimo tem sido o de escutarem com unção o “Hino à Alegria” e o de alimentarem a pança com trufas e caviar “Beluga” , jotinhas acéfalos, filhos de pais ricos, em passo de corrida para a imbecilidade irreversível e para as gravatas acetinadas, em azul-cueca delirante, e outros ofícios correlativos, aos quais se atribui a ventura da Nação e o “esplendor” de Portugal.
A camada intermédia , que poderia almofadar a contradição entre o primeiro grupo e o segundo, acabou de ser exterminada pelo “Láparo”. Mas eu suspeito que é tamanha a crença do primeiro grupo na possibilidade de se conseguir promover ao segundo grupo – possibilidade que equivale, ponto por ponto, a sair o euromilhões a uma aposta de dois euros – que a “laparada” ainda pode acabar por fazer a festa nas próximas eleições legislativas. E aí eu direi que os “tesos”, os miseráveis, os famélicos, os sem-abrigo, os roídos pelas doenças e pelos piolhos , merecerão – oh, se merecerão ! – a sorte que lhes irá assistir.

Um pensamento sobre “ANATOMIA DA ACTUAL SOCIEDADE PORTUGUESA

  1. Professia tenebrosa mas possível com muito povo masoquista existente em Portugal. Levam porrada e tornam a baixar a cerviz para levarem mais porrada.

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