Mais vale ser um perdigueiro português do que uma couve de Bruxelas

Pacheco Pereira

                Pacheco Pereira

(José Pacheco Pereira, in Revista Sábado, 05/06/2015)

O slogan é bom e infelizmente não é meu, é do partido eurocéptico inglês UKIP. No original diz I am a british bulldog not a Brussels sprout. E traduzido para português podia ter várias variantes: “Mais vale ser um cão Serra da Estrela do que uma couve de Bruxelas”. Eu preferi para título outra variante, mais adequada ao adjectivo “português”. Mas em todos os casos está lá a “couve de Bruxelas”. O problema é que, para proteger as couves de Bruxelas, colocou-se lá um pastor alemão e vários dobermann e ninguém quer levar lá o nosso hábil perdigueiro. Preferem ir todos vestidos de couve de Bruxelas.

Nenhuma eleição europeia recente deixou os socialistas em bom estado
Pode ser na Grécia, no Reino Unido, em Espanha, em Itália, um pouco por todo o lado, os partidos socialistas membros da Internacional Socialista, muitos signatários do Pacto de Estabilidade e ligados em vários países a variantes das políticas austeritárias, chegam às eleições e têm resultados muito piores do que as coligações e partidos de direita que conduziram sem ambiguidades as políticas alemãs e do FMI. No Reino Unido, os trabalhistas seguiram uma política pouco convincente de retórica antiausteridade, mas frouxa nas propostas concretas para mudar de rumo e de vida. Na Grécia, em Espanha, e em Itália, idem.

O que se passa compreende-se. Apesar das enormes perdas de votos que os conservadores no Reino Unido e o PP em Espanha tiveram, mantiveram as suas maiorias, apoiados em último recurso no desenho do sistema eleitoral no caso inglês, e na capacidade de terem feito uma bipolarização imperfeita só de um lado. Acontece, um lado vai às urnas contra o outro, o outro quer ser o outro lado, mas não consegue.

Esses partidos como o PP e os conservadores, e mesmo a Nova Democracia, são hoje the real thing, e é mais fácil votar nos partidos que verdadeiramente acreditam na “coisa” e a praticam do que em versões delico-doces da mesma “coisa”. O original mobiliza sempre mais os seus do que a cópia. Entre o original brilhando de todas as cores e uma cópia em papel reciclado, o poder de retenção do original é sempre maior.

Os socialistas sofreram um enorme processo de descaracterização, em parte devido a mudanças sociais, em parte devido a terem deixado sem representação no centro político muitos dos mais afectados pela crise económica e social dos últimos anos.

O mundo dos socialistas já não é o do Labour pré-Thatcher, mas as mudanças sociais que criaram uma classe média pouco “socialista”, que aliás nunca se caracterizou por ser muito anti-socialista, como antes fora anticomunista, hoje poderiam jogar a favor dos socialistas caso eles fossem o partido de oposição às políticas austeritárias. Como não são, as mudanças sociais, em particular a crise de futuro, o empobrecimento da classe média e a inversão de marcha do elevador social, que funcionava para muitos deixarem a pobreza, radicalizam a classe média e levam-na para a abstenção, para o populismo, ou para partidos alternativos de uma nova esquerda, como o Syriza, ou o Podemos, ou mesmo os nacionalistas escoceses.

Os socialistas ficaram a nadar no nada, e os partidos de direita muito radicalizados pela crise, controlando a União Europeia com mão de ferro, com ligações próximas com os interesses económicos, em particular os financeiros, seguindo políticas anti-sindicais e governando, como diria Marx, em função dos seus interesses de classe, assumem um papel mais “orgânico” do que os socialistas perderam.

A crise da democracia nos nossos dias tem uma forte componente de desrepresentação por parte dos partidos do centro moderado, que afecta mais a esquerda do que a direita. A direita virou ainda mais à direita, mas essa viragem é feita dentro dos partidos tradicionais que estavam mais ao centro. O caso do PSD é nítido. Na esquerda, o processo quer de moderação quer de radicalização saiu para fora dos partidos socialistas. Daí o crescimento de novos partidos e novos movimentos que assumem, nalguns casos com sucesso, essa representação perdida, dos jovens, da classe média e dos trabalhadores.

O resultado é o fim ou a crise de uma certa bipolarização, o aparecimento de processos multipolares como se está a dar em Espanha, e mesmo quando tal não acontece por razões de história do sistema político como é o caso de Portugal, o PS tem cada vez maiores dificuldades de funcionar como pólo alternativo, com um PCP a fortalecer-se e uma pletora de pequenos movimentos a desviar votos. Sem ganhar votos ao PSD, sem se impor à sua esquerda, também não impede o crescimento dos votos brancos e nulos de protesto e da abstenção. E se não conseguir bipolarizar, como já aconteceu na Madeira, vai ter uma “vitorinha”, ou um quase empate, e isso em ambos os casos é uma vitória para a coligação PSD-CDS, que só precisa de esperar pelas próximas eleições para ganhar outra vez, se não for já desta.

O caso que envenenará as eleições
Se houver acusações de corrupção a Sócrates com indícios sólidos, muito dificilmente elas deixarão de extravasar para os governos do PS, associando a memória da bancarrota com a putativa actividade criminosa do primeiro-ministro do PS. E ninguém tem ilusões de que a coligação vai usar esta situação ad nauseam, sendo tanto mais virulenta quanto maior for o seu desespero eleitoral. O facto de o PS ainda estar à frente nas sondagens, mesmo com este lastro “socrático”, revela a amplitude da recusa da actual governação. Mas este tempo ainda está muito meigo. Para a frente tudo vai ser pior, numa campanha em que vai valer tudo, mesmo tirar olhos.

5 pensamentos sobre “Mais vale ser um perdigueiro português do que uma couve de Bruxelas

  1. Quando a nova geração de eleitores se começara a fazer sentir esta fauna politica estilo esquerda /direita leva um varridela que só para como nos outros países: ficam residuais. Até a mim que já venho do PREC esta linguagem pseudo intelectual já me cansa quanto mais a geração do meu filho que nem quer ouvir; muda logo de canal.

  2. “Se houver acusações de corrupção a Sócrates com indícios sólidos, muito dificilmente elas deixarão de extravasar para os governos do PS, associando a memória da bancarrota com a putativa actividade criminosa do primeiro-ministro do PS”
    Este falhado político, amigo, apoiante, companheiro e correligionário dos maiores corruptos de sempre deste país como duarte lima, durão barroso, costa do bpn, cavaco e todos da escola de corruptos que foi o cavaquismo, vem, com ” o caso que envenenará as eleições” precisamente sugerir, aos seus amigos ‘magistrados” que engaiolaram Sócrates, o trabalhinho a que devem proceder para, novamente, a troika dos seus formada por cavaco-passos-portas voltarem a ganhar as próximas eleições.
    Este nobre ducal fallado político, corrupto político, amigo e ajudante de corruptos da pior espécie, tem a lata, hoje com Sócrates na cadeia por acusações de corrupto que ajudou a construir sem uma única prova que o consiga levar a julgamento, tem hoje a lata, dizia, de colocar a questão de “se houver acusações de corrupção”.
    Como sempre pensou e praticou, pacheco continua lídimo sicário de cavaco e tuti cavaquista e, este tratado da pulhice que é “o caso que envenenará as eleições” é o perfeito exemplo da filha da putice ao vir incitar os ‘magistrados’ intocáceis a quem Sócrates se atreveu a tocar, que façam o resto do trabalho para pacheco ter razão e poder reconciliar~se com os verdadeiros corruptos sanguessugas do país, seus amigos que lhe reservarão cadeirão dourado a que se julga com direito por pachecal herança de berco.

    • Ó jOSÉ NEVES, você parece que tem um ódiozinho de estimação contra o JPP. Só o João Miguel Tavares é que o bate aos pontos cultivando o seu “ódiozão” contra o Sócrates…:)

  3. O caro “estatuadesal” não tem mais nada para comentar os meus comentários sobre a pacheca figura que dizer que tenho um ódio de estimação contra jpp.
    O caro que, pelo pouco que já disse sobre a pacheca figura, me parece andar embasbacado pela capacidade de improvisação literária do da marmeleira, engana-se a meu respeito; eu não tenho um ódio de estimação contra pacheco mas sim um ódio puro do seu ser (dele, pacheco) como político.
    E muito menos deve ajuizar sobre comparações com jmt pois que, tal sabujo, serve-se de fingir tal ódio a Sócrates por puro oportunismo o que já o alcandorou a cronista do “público” e a “ministro sombra” da tv e cassete pirata e que assim continuará enquanto o ódio a Sócrates render dividendos pessoais; é mais um talento parasitário.

    • Caro José Neves. Sobre o que diz acerca do JMT, 100% de acordo. É uma figurinha deprimente, representante lídimo do Portugal vazio e sem ideias que vai engalanando o espaço mediático. Sobre o Pacheco, você não lhe comenta os textos actuais e só sobre esses é que eu me pronuncio e com os quais concordo em grande parte. Você comenta-lhe o passado e acha que, em função desse passado, o homem não tem legitimidade para escrever hoje o que escreve e defender o que defende. É nesse aspecto que eu acho estranha a sua postura e a comparei à do JMT, ainda que não quisesse nunca dizer que seja tão “rasca” como o JMT. Adiante. Só lhe ponho um desafio. Esqueça tudo o que sabe sobre o Pacheco, o seu passado, percurso ML, governativo, etc. Pegue num dos textos do dito cujo. E experiente ver se concorda, ou não, com a análise que ele produz sobre o cenário político actual e sobre as politicas demenciais de Passos e Portas. Não interessa discutir porque o faz. Se é por ressabiamento, por despeito, por dor de corno ou seja lá porque for. A questão é que o faz e eu não vejo, à esquerda, ninguém o fazer com o mesmo nível e gabarito intelectual. E é pena.

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