Nada menos exigente do que chumbar todos

(Mariana Mortágua, in Jornal de Notícias, 19/05/2015)

Mariana Mortágua

                     Mariana Mortágua

Pelo segundo ano consecutivo e a segunda vez em democracia, crianças de 9 ou 10 anos foram ontem chamadas para fazer um exame do 4.º ano. Não tenho nada de especial contra os exames. Eu própria já fiz muitos ao longo dos últimos anos. Coisa diferente é dizer que uma criança de 9 anos deve fazê-los.

Para fazer esta discussão é preciso antes desmontar os mitos que a rodeiam.

O primeiro é que é assim em todo o lado. Falso. Há apenas dois países em que crianças com esta idade fazem exames (Portugal e Áustria). Em muitos outros há provas de aferição, como acontecia em Portugal até Nuno Crato.

A semelhança entre uns e outros é que ambos aferem os conhecimentos dos alunos, as competências ensinadas por escolas e professores, e como é que estão a reagir. A diferença é que as provas de aferição aferem, os exames chumbam. As crianças sabem isso, como o sabem as escolas que passam os últimos dois meses não a ensinar, mas a preparar para o exame. O segundo mito é que, com exames ou sem exames, ninguém chumba em Portugal. Falso, tristemente falso. Portugal tem a terceira maior taxa de retenção dos alunos até aos 15 anos. Um em cada dez alunos, diz o Conselho Nacional de Educação, fica retido logo no 2.º ano. Ou seja, com sete anos já levam um ano de atraso. Não se pense que chumbar muito é ser mais exigente. Pelo contrário, é o mais fácil. Significa desistir, desde cedo, de quem tem dificuldades. É o triunfo da exclusão onde devia haver apoio e da desistência onde devia haver superação. Não há nada menos exigente do que chumbar toda a gente.

Terceiro mito. “No meu tempo, havia exame na quarta classe e sabia-se mais”. Pois é. Mas o exame, na ditadura, tinha lugar na 4.ª classe porque este era o patamar máximo a que era permitido ao povo estudar. Era uma prova de exclusão. Quem não tinha dinheiro, quase todos, dificilmente voltava a ver uma escola. A democracia, felizmente, acabou com esses tempos e abriu a escola a toda a gente.

Este exame tem o efeito de seriação social que tem sido uma das imagens de marca de Nuno Crato. Do ensino dual para quem chumbou dois anos, ao fim do Inglês no primeiro ciclo para 65 mil crianças, ou à substituição do programa de Matemática – contra todos os pareceres, sem estudar impacto e sem nenhuma formação específica para os docentes. Crato não é exigente. É desistente. De uma escola que integra e não deixa nenhuma criança para trás. Que, pelo meio, os resultados que tanto evoluíram nos últimos anos comecem a dar sinais de regressão não é de estranhar.

DEPUTADA DO BE

2 pensamentos sobre “Nada menos exigente do que chumbar todos

  1. “Que, pelo meio, os resultados que tanto evoluíram nos últimos anos comecem a dar sinais de regressão não é de estranhar.”

    Pois, e onde estava a menina esperta, e a esperteza; quando levantou o bracinho no ar ao lado do psd e cds para derrubar o anterior governo e dar aos portugueses, a todos, este governo de que agora se queixa?
    A antiga justiça divina de Ares era justa porque matava os que matavam; neste caso a menina esperta matou o anterior governo mas o actual mata tudo e todos.
    Todos não; a menina esperta, será por isso que é esperta, continua no poleiro de S. Bento, na mesma e igualzinha.
    Os meus parabéns.

  2. Seja mais profunda e deixe o simplismo da logica partidaria para os que têm menos a perder. Ganhou um estatuto de seriedade que deve evitar embrenhar-se na conversa banha da cobra que os partidos infelizmente acham que é a mais eficaz. Mas olhe que não é e a sua corrida não deve ser de um ano ou dois; quando chegar a senior verá que valeu a pena uma postura constante de intervenção e seriedade. A educação como sabe melhor que eu tem sido uma feira de votos e poucos foram os ministros que fizeram mais que negociações ,com os 300 mil votos do sindicato em mente. Que se lixem os alunos, se nem os pais se interessam verdadeiramente porque nós desprezarmos tanto voto?

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