Sete teorias de conspiração sobre a TAP

(Pedro Santos Guerreiro, in Expresso Diário, 06/05/2015)

Pedro Santos Guerreiro

                   Pedro Santos Guerreiro

Temos muitas razões para sermos desconfiados. Sobretudo quando há privatizações. Porque cada uma delas é um negócio e em cada negócio há interesses, há dinheiro e há opacidades. Da desconfiança nasce a investigação. E a especulação. “E se por detrás disto está aquilo?”

Teoria de conspiração #1: e se esta greve do sindicato dos pilotos serve o interesse de quem quer a privatização, porque será usada para legitimar a ameaça de uma reestruturação por quem a quer vender e porque desvaloriza a empresa, tornando-a mais barata para quem a quem comprar?

A teoria tem direitos de autor mas não são meus, são de muita gente que desconfia da marcação e manutenção de uma greve que, além do sindicato, não só ninguém defende como toda a gente ataca. Como parece uma greve estúpida, então teria de haver uma razão oculta e, perversamente, essa razão beneficia aqueles que supostamente a greve ataca: governo e candidatos.

Teoria de conspiração #2: a ameaça de que a TAP pode fechar é bluff, já em 2012 se dizia o mesmo e a empresa ainda aí está. O silogismo é admissível, a empresa vive desde 1997 (desde 1997!) sem mais um tostão do Estado e os bancos continuam apesar de tudo a emprestar dinheiro à companhia. Até esta greve, a TAP tinha uma situação de tesouraria no limite, pede empréstimos para pagar empréstimos mas a operação está equilibrada, pelo que a dívida total não aumenta. Se desde 2008 está em “falência técnica” (capitais próprios negativos), por que razão a hecatombe tem data marcada para 2015?

Há neste negócio muitos negócios – e muitas negociatas. Uma operação como esta movimenta muitos assessores, sobretudo bancos de investimento e advogados

Teoria de conspiração #3: o governo quer vender a TAP porque quer vender até a mãe, nada justifica vender uma joia por tão pouco. De facto, as expectativas de encaixe financeiro são relativamente baixas, provavelmente ele será menor que 100 milhões de euros, o que cabe na cova de um dente do Estado. Assim sendo, não há outra razão que não seja a ideologia liberal do governo para avançar com esta operação. Ou então há outra razão, o que nos leva à…

Teoria de Conspiração #4: há neste negócio muitos negócios – e muitas negociatas. Uma operação como esta movimenta muitos assessores, sobretudo bancos de investimento e advogados, do lado do Estado e do lado dos candidatos, que recebem muito mais se a privatização for selada. O interesse próprio destes assessores leva-os a ativar lóbis. Além disso, há razões para suspeitar que há comissões e dinheiros ocultos distribuídos por agentes que tentam forçar políticos e decisores. E portanto há interesses particulares que forçam um negócio prejudicando o interesse público.

Teoria de conspiração #5: não é verdade que o Estado não possa injetar dinheiro na TAP. Pois não. Nesse caso, no entanto, a injeção é considerada uma ajuda de Estado, o que requer a autorização da Comissão Europeia, que pode aprovar impondo condições. Tipicamente, as condições são impor uma redução da atividade da empresa: a Direção Geral de Concorrência (a famosa DGCom de Bruxelas) considera que todas as ajudas de Estado são anti-concorrenciais pelo que a empresa tem de ser proporcionalmente penalizada, de modo a que as empresas concorrentes sejam compensadas e se consiga um reequilíbrio de mercado.

Teoria de conspiração #6: as teorias de conspiração anteriores resultam de um estado de negação coletivo. Esta é a minha teoria de conspiração. Defendo há muitos anos a privatização da TAP essencialmente pela razão de que a TAP está a definhar a cada dia que passa sem uma injeção de capital, sendo que a injeção de capital pelo Estado (Teoria #5) obriga a uma TAP mais pequena – e uma TAP mais pequena não serve o interesse de Portugal. O que serve o interesse de Portugal é uma TAP com capacidade de investir em novos aviões e novas rotas, e não uma TAP com uma frota envelhecida porque o excesso de dívida consome toda a companhia.

Há muitas razões para sermos desconfiados (e há muitas mais teorias de conspiração do passado: a compra da Portugália foi um favor ao Grupo Espírito Santo? O investimento na manutenção no Brasil aproveitou a quem?). E, de todas as teorias de conspiração anteriores, a única que adoto é a #4: há neste negócio muitos negócios – e muitas negociatas. Há sempre comissões largadas pelo caminho de forma muito pouco transparente, levantando suspeitas de corrupção. De resto, o que o governo está a vender é também um enorme passivo (Teoria #3): o vendedor recebe menos de cem milhões mas o comprador “entra” com mais de mil milhões. Sem privatização, a TAP não fecha de um dia para outro (Teoria #2) mas não há bluff nenhum na ameaça de reestruturação: basta olhar para as contas da TAP e atestar a situação dramática. O que nos leva à greve (Teoria #1): a quem serve? A ninguém. Ela pode de facto legitimar o contexto de reestruturação, mas só desvaloriza a empresa, que perde irremediavelmente a confiança (e portanto a preferência) de muitos passageiros apeados. Portanto, podemos admitir que a greve que parece estúpida seja, de facto, apenas estúpida.

Teoria de conspiração #7: este é apenas mais um texto a defender a privatização da TAP.

Pois é.

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